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Perguntas e respostas: a filosofia na simplicidade das crianças

É importante ver não somente as árvores, mas também a floresta; Deus pode estar nos detalhes, mas está também no panorama abrangente da epistemologia da crença cristã.

Alvin Plantinga

Uma inteligência que não seja agitada por boas questões não tem como apreciar nem mesmo a importância das melhores respostas. Aprender as respostas é bastante fácil. Mas desenvolver inteligências ativamente inquisitivas, avivadas por questões reais e profundas – isso é outra história.

Mortimer Adler

Talvez o mundo não seja como você imagina. Talvez ele sequer exista como nós o conhecemos. À primeira vista, isso parece um tanto inusitado, e até mesmo sem sentido. Mas foi com uma questão como essa que me deparei quando certo dia encontrei no shopping um livro cujo título é dos mais curiosos: Por que o mundo não existe, de Markus Gabriel, pela editora Vozes. Me lembro até hoje que quando li o título pela primeira vez fiquei intrigado. Uma das coisas mais unânimes neste mundo é justamente o fato de que ele existe. A mera possibilidade levantada por alguém de que o mundo como nós o conhecemos talvez não exista de fato parece estranha, de certa forma uma ofensa à inteligência e à nossa experiência sensível. Como pode tal pensamento? Porque alguém escreveria um livro cujo título coloca em xeque a realidade do mundo no qual ele escreveu?

A bem da verdade, o autor, a despeito da curiosidade do título, toma nota no livro de uma questão filosófica, por mais inusitada que pareça, e investiga se esse problema algum dia realmente foi bem compreendido. Mortimer Adler dizia que um dos charmes da filosofia é justamente o de levantar o tipo de perguntas à primeira vista inusitadas que até mesmo uma criança o faria: “As crianças fazem perguntas admiráveis: “Por que as pessoas existem?” “O que é que o gato quer?” “Qual o nome do mundo?” “Por que Deus criou o mundo?”. Da boca das crianças sai, senão a sabedoria, ao menos a busca por ela. A filosofia, segundo Aristóteles, nasce do espanto. Ela certamente começa na infância, mesmo que, para a maioria de nós, também acabe nela” (ADLER; DOREN, 2010, p. 277).

A filosofia é amiga da curiosidade. Ela começa com questões “infantilmente simples”, nas palavras de Adler, ao mesmo tempo fundamentais e muitas vezes difíceis de responder. Os grandes clássicos da tradição filosófica trataram precisamente de questões dessa natureza. “O que é a justiça?”, pergunta do livro I da República, de Platão — uma conversa a princípio aparentemente simples entre amigos e que resultou numa das obras mais importantes da história da filosofia — “Por que existe algo em vez do nada?”, ou, “Para onde as pessoas vão depois que morrem?”. É como se Platão e os demais filósofos, parafraseando Salomão, dissessem: “Vai ter com as crianças, ó estudante de filosofia, observe as suas perguntas e sê sábio!”:

Não é preciso pensar como crianças para compreender a existência. As crianças certamente não a compreendem nem conseguiriam compreendê-la — se é que alguém realmente consegue. Mas é preciso ser capaz de ver como as crianças veem, de sentir o espanto que elas sentem, de questionar como elas questionam. As complexidades da vida adulta atrapalham a verdade. Os grandes filósofos sempre foram capazes de dissipar as complexidades e enxergar distinções simples — simples uma vez que sejam formuladas, e que antes eram imensamente difíceis. Se formos segui-los, nós também teremos de ser infantilmente simples em nossas perguntas — e ter a maturidade da sabedoria em nossas respostas (ADLER; DOREN, 2010, p. 278).

É comum o pensamento de que a filosofia se preocupa, sobretudo, em questionar e nem tanto responder, que a dúvida é um tipo de virtude intelectual a ser sempre cultivada sob pena de perda do verdadeiro conhecimento, mas de tal forma que qualquer ideia de verdade absoluta deve ser descartada. Se a pessoa professa algum tipo de crença, especialmente a cristã, então, a tensão está declarada. Como é possível alguém crer em Deus e ao mesmo tempo estudar filosofia? Não seria mais racional acreditar que o mundo não existe?

É evidente que a dúvida é parte importante de todo e qualquer processo de aprendizado, pois “uma inteligência que não seja agitada por boas questões não tem como apreciar nem mesmo a importância das melhores respostas” (ADLER; DOREN, 2010, p. 277). Mas a dúvida é apenas um dos elementos da atividade filosófica. A busca pela verdade também é uma demonstração de amor pela sabedoria, e de modo algum implica numa incompatibilidade com a crença em Deus, e em Jesus Cristo, em particular. Se o Logos se fez carne (Jo 1:14) e nele se encontra “todos os tesouros da ciência e da sabedoria” (Cl 2:3), então é de se esperar que haja também dos seus “atributos invisíveis” na filosofia (Rm 1:20).

Na acepção de Mário Ferreira dos Santos, a filosofia “é um saber que se move, através de perguntas e respostas” (SANTOS, 2018, p. 23). Para isso, é necessário ter a simplicidade das crianças, compreender a profundidade das suas perguntas para que, assim, seja possível encontrar a devida maturidade da sabedoria nas suas respostas.


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Referências Bibliográficas

ADLER, Mortimer; DOREN, Charles Van. Como ler livros: o guia clássico para a leitura inteligente. Trad. Edward H. Wolff e Pedro Sette-Câmara. São Paulo: É Realizações, 2010.

SANTOS, Mário Ferreira dos. Filosofia e Cosmovisão. São Paulo. É Realizações, 2018.

1 comment

  1. PAULA DA SILVA COSTA

    Amém por isso. Que não paremos diante dúvida, mas que o Espírito Santo nos conduza a verdade!
    Uma vez, um amigo me impactou com uma frase : ´´ A filosofia nasce do espanto e ninguém até hoje me espantou mais que Cristo“.

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