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Sobre o culto cristão

Escrito pelo estudante Mateus Victor Rigolin, estudante do Programa de Tutoria Essencial — Turma 2021

Introdução

Todo cristão que entende o chamado para ser parte do corpo de Cristo participa de cultos semanais: reuniões aos domingos, ou durante a semana, onde os membros de uma igreja oram, cantam, ouvem um sermão, participam da Ceia do Senhor e têm comunhão uns com os outros.

Apesar de ser uma atividade que faz parte da “rotina”, será que estes cristãos sabem o motivo de se reunirem? Será que conseguem perceber se suas reuniões louvam o único e verdadeiro Deus?

Este é um tema muito mais extenso do que será apresentado neste artigo, contudo, o objetivo é, justamente, incentivar a busca por maior orientação e reflexão a respeito do assunto.

Por ora, serão tratados dois pontos: (1) o que vem a ser “adoração” e (2) como conduzir a adoração coletiva para ser um “sacrifício vivo, santo e agradável a Deus”1. Como apoio, serão utilizados os textos de D. A. Carson, Kent Hughes e Timothy Keller, escritos para o livro Louvor.

O que é “adoração”?

Definir adoração não é tão fácil quanto parece. Segundo Robert Shaper, citado por D. A. Carson,

a adoração, assim como o amor, é caracterizada pela simplicidade intuitiva (todos ‘sabem’ o que é adoração, assim como todos ‘sabem’ o que é amor) e a complexidade filosófica (quanto mais você tenta definir amor ou adoração, mais difícil se torna a tarefa) (CARSON et al., 2017, p. 24, ênfases do autor).

A Bíblia nos traz em toda a sua narrativa momentos de adoração, pessoas perguntando como adorar e, inclusive, um livro dedicado às instruções dos sacrifícios israelitas (Levítico). Apesar disso, a palavra “adoração” hoje nem sempre nos remete a Deus. Muitas vezes é utilizada em lugar de “gostar” e “amar”, ou mesmo em um tom mais sarcástico, quando algo não agrada.

C. S. Lewis, em seu ensaio intitulado A Morte das Palavras, trata sobre como as palavras vão tomando outros sentidos no decorrer da história. Palavras que um dia foram objetivas para uma descrição, hoje podem ser utilizadas para insultar ou elogiar alguém. Com a palavra “adoração” é possível notar essas mudanças também.

Por conta disso e, para ajudar na compreensão do uso da palavra neste texto, vem a seguir a definição de Carson — que, na íntegra, é bem mais longa, mas os recortes abaixo são suficientes para os assuntos que serão tratados a seguir:

A adoração é a resposta adequada de todos os seres morais e sensíveis a Deus, atribuindo de maneira agradável toda a honra e valor ao seu Deus Criador precisamente porque ele é digno. (…) Tal adoração, portanto, manifesta-se tanto na adoração como na ação, tanto no cristão individual quanto na adoração coletiva (…) (CARSON et al., 2017, p. 25, ênfases do autor).

A partir da definição acima, serão tratados dois tópicos: (1) a forma de adoração “adequada” e “agradável”; e (2) a adoração individual e coletiva. Ambos apresentados a seguir, na ordem inversa.

1. Adoração individual e coletiva

A adoração é demonstrada e oferecida a Deus “tanto no cristão individual quanto na adoração coletiva” (CARSON et al., 2017, p. 25). Pode-se dizer que essa é uma ampliação que Cristo estabeleceu através de sua morte e ressurreição.

No Antigo Testamento (AT) a apresentação das ofertas ao Senhor deveria ser feita apenas por um grupo seleto de pessoas, os sacerdotes, homens da tribo de Levi, e em um lugar específico, no tabernáculo que fora construído de acordo com as instruções do próprio Deus.

Todos estes rituais, no entanto, eram uma sombra do que haveria de vir e se cumprir em Cristo. Este foi, por exemplo, o motivo pelo qual o autor de Hebreus se dedicou na escrita de sua carta, mostrando como Cristo é superior ao sacerdócio levítico, ao tabernáculo e aos sacrifícios.

Com a cruz, temos também o véu do santuário se rasgando. O véu que separava o lugar santo do lugar santíssimo, que representava a separação entre os homens e Deus, por conta do pecado. A partir da morte e ressurreição de Jesus não há mais limitações para se apresentar a Deus, Cristo abriu o caminho.

Isto posto, é possível compreender que a adoração não está mais limitada a um lugar específico, com pessoas específicas. Esse, inclusive, é um dos temas da conversa que Jesus teve com a mulher samaritana no evangelho de João, capítulo 4. Assim, “adoração” trata de todo o espectro da nossa vida. “Assim, quer vocês comam, quer bebam, quer façam qualquer outra coisa, façam tudo para a glória de Deus”2.

Apesar desta ampliação do conceito de adoração, o Novo Testamento (NT) não elimina a reunião para o culto público. Ainda existem ordenanças para a adoração coletiva que precisam ser cumpridas. Reunir-se uns com os outros é imprescindível e o próprio escritor de Hebreus também adverte quanto a isso3.

Resumindo, portanto, “adoração” é algo que deve permear toda a nossa vida, mas não deixa de ter um aspecto específico para quando a igreja — o corpo de Cristo — se reúne. Para essa reunião, também, há a maneira adequada e agradável a Deus de conduzir a adoração.

2. A resposta adequada e a maneira agradável

Sabendo que a adoração cristã deve assumir toda a vida, o culto semanal não pode ser visto como o “ambiente de adoração”, como se toda a semana fosse vivida da maneira que mais agradasse à pessoa e, na igreja, ela, então, fosse para se dedicar à adoração.

Claro que o intuito da reunião é, sim, adoração — mas não é o momento exclusivo para isso; antes, é o momento de adoração coletiva. Ou seja, durante a semana também houve adoração, mas em um contexto individual ou familiar. Na reunião da igreja surge a oportunidade de adorarem como comunidade.

Uma vez que, para o culto público, importa que haja consciência da ideia de “corpo de Cristo”, a pessoa ao lado, no banco, também é importante para esse momento. A adoração é totalmente centrada no Deus trino, porém, não deve ser diminuído o propósito de edificação que a reunião tem. A reunião é essencial para o crescimento espiritual dos membros, inclusive, ela o intensifica. Conforme escreve Kent Hughes,

Esse efeito intensificador da adoração coletiva aumenta a edificação. De fato, a edificação não florescerá como deve à parte da Palavra, porque ouvir a Palavra de Deus em meio do assentimento coletivo de uma congregação, intensifica o envolvimento da mente, bem como a recepção da verdade. Da mesma forma, a participação na comunidade de fé se intensifica levando a verdade a sério. E então, o exemplo da verdade vivida leva o cristão a viver a verdade radical da Palavra de Deus. O culto coletivo é essencial para a edificação (CARSON et al., 2017, p. 142).

Sabendo da importância do momento de adoração coletiva para a edificação, é necessário que saibamos a forma adequada e agradável de adorar, não para que a adoração se torne um meio para a edificação — não é dessa forma que se relacionam adoração e edificação —, mas porque Deus é santo e importa que saibamos qual a forma de louvor que o agrada.

Timothy Keller nos lembra que “a Bíblia simplesmente não nos apresenta detalhes suficientes para moldar um culto completo quando nos reunimos para adoração” (CARSON et al., 2017, p. 201) — diferente dos detalhes que Levítico trazia para o culto no AT. Apesar disso, existem elementos ordenados e por isso precisam ser postos em prática e obedecidos. Por exemplo: oração, ensino e comunhão (Atos 2.42), leitura das Escrituras (1 Timóteo 4.13), cânticos (Efésios 5.19), e os sacramentos: a Ceia do Senhor (1 Coríntios 11.24) e o batismo (1 Pedro 3.21).

Com base nestes mandamentos bíblicos é possível observar a importância de como o culto público deve ser conduzido. Não com base em gostos pessoais ou “naquilo que dá certo” — com um pragmatismo mais preocupado em afagar os egos do que voltar o coração à adoração e edificação.

Antes, é necessário entender “o que Deus espera de nós?” e não avaliar simplesmente se estamos gostando ou não do culto (CARSON, 2017, p. 28).

Conclusão

Analisando estes dois pontos, é possível compreender a declaração de Kent Hughes, quando diz que “[ele] pessoalmente [vê] como conduzimos o culto coletivo como uma questão de vida ou morte” (CARSON et al., 2017, p. 142, ênfase do autor).

Entender que a forma adotada no culto molda a vida de adoração e o próprio relacionamento com Deus fará com que haja mais dedicação e preparo para essa tarefa “rotineira”.

Como o autor de Hebreus nos fala, nosso Deus é “fogo consumidor”4 e importa que entreguemos a Ele uma adoração aceitável, conforme Ele mesmo orienta.


Quer entender mais sobre teologia e filosofia?


1. Romanos 12.1.

2. 1 Coríntios 10.31.

3. Hebreus 10.25.

4. Hebreus 12.29.


Referências

CARSON, D. A. et al. Louvor: análise teológica e prática. Tradução de Wilson de Almeida. 1ª ed. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017.

LEWIS, C. S. Sobre histórias. Tradução de Francisco Nunes. 1ª ed. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2018.