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Orgulho em nossa teologia pública: o senhorio de Cristo como caminho para uma atuação fiel

Escrito por Ana Virgínia Pereira da Silva, estudante do Programa de Tutoria — Turma Essencial 2021

Os teólogos de rede social chegaram para ficar. Convidados a “pregar” para multidões com o advento da revolução digital, nos parece que estão decididos a lutar arduamente para manter esse espaço público conquistado sem muito esforço — ao menos o esforço intelectual. E, assim, muitos dormem cancelados e acordam com milhares de novos seguidores em seus perfis.

Não é difícil concluir que as políticas do cancelamento ou do boicote, na maioria dos casos, tendem mais a fortalecê-los do que fragilizá-los.

Mas nem é sobre teólogos charlatães e mal-intencionados que queremos tratar hoje. Eles não são os únicos que cometem erros. Aqueles preocupados em servir fielmente a Cristo e fazer boa teologia também.

Por conta de alguns desses erros é que os crentes se digladiam dia e noite nas redes sociais, como que ignorando a “nuvem de testemunhas” mencionada em Hebreus 12.1. Quando o tema envolve ética cristã, então, os debates se acirram e a troca de farpas dá lugar a ofensas mútuas diretas, frequentemente sem filtro.

E por que é importante tocar nisso? Porque é um problema que compromete uma característica essencial à comunidade dos santos: a unidade da igreja. 

Sem dúvida, há muitas razões para isso. Uma delas, porém, nos chama a atenção. É o velho problema do orgulho. Bravamente escondido por trás das atitudes e posicionamentos mais bem intencionados, o orgulho é, justamente por sua sutileza, um “fermento” que cresce à sua maneira sutil e envenena toda a “massa” da participação da igreja na vida pública.

Lecionando sobre algumas armadilhas nas quais caímos em nosso esforço de servir fielmente a Cristo em todas as áreas da vida, Vern S. Poythress1 nos adverte que o orgulho “tem sido um problema humano fundamental desde a queda. De uma perspectiva, pode ser visto como estando na raiz de todo pecado”. Está, portanto, à nossa espreita também quando o assunto é teologia pública e, ainda mais, quando se trata de redes sociais. E, nesse cenário, em que a imagem é supervalorizada, a chance de sermos engodados por ele é ainda maior.

Outro aspecto que merece destaque na esteira do que Poythress2 ensina é o fato de que o orgulho está ligado às nossas motivações. Ou seja, o que está “por trás” das nossas obras, das nossas ações e, também, dos nossos posicionamentos públicos. Por isso mesmo, é uma daquelas inclinações pecaminosas sutis e difíceis de desarraigar às quais o autor se refere.

Pois bem. É esse orgulho sutil que nos motiva quando esquecendo dos imperativos de unidade e amor que deveriam marcar a igreja assumimos uma postura bélica, irônica, sarcástica, desrespeitosa contra os próprios irmãos nas redes sociais. E o resultado é uma teologia pública que reforça diferenças e divide uma igreja já tão fragilizada por inimigos externos como o secularismo.

Ainda segundo Poythress3, a solução passa por um resgate da identidade do cristão como servo de Cristo. “Levar a sério o senhorio de Cristo envolve uma mudança radical”. Uma mudança que inclui “atitudes e motivações transformadas” e está intimamente ligada à obra transformadora do Espírito em nós: “é somente através do poder dele que recebemos o poder de mudar de uma maneira fundamental”4. Em outras palavras, “a vida cristã envolve morrer diariamente para o egoísmo e o orgulho”5.

O que nós evangélicos no Brasil estamos esquecendo é que, mais do que um raciocínio intelectualmente correto, nossa teologia pública exige um relacionamento pessoal sadio com Cristo. Um relacionamento livre do orgulho. Um relacionamento marcado por morte diária. Precisamos parar de cobrar tanto a morte alheia e nos ocuparmos mais dos nossos próprios processos fúnebres.

Se formos honestos com nós mesmos, iremos perceber que grande parte dos conflitos que alimentamos nas redes sociais no afã de produzir boa teologia tem como pano de fundo um orgulho não tratado. O desejo oculto de “prevalecer” nos embates públicos. Todavia, como observa Poythress6, servir a Cristo como Senhor significa servir-lhe acima de nós mesmos. Significa crucificar nosso orgulho. Enquanto não nos ocuparmos disso, nosso esforço de fidelidade nessa área de atuação será absolutamente em vão.

É que não seremos ouvidos pelo mundo enquanto não formos um, como igreja. As advertências de João 15.357 e de Mateus 12.258 precisam ser lembradas: nosso testemunho individual nunca será eficaz enquanto comprometer o testemunho da comunidade, ou seja, da igreja.

Precisamos vigiar e revisitar constantemente nossas intenções, permitindo que o Espírito Santo realize sua obra diariamente em nós, nos submetendo a Cristo como Senhor e nos livrando do orgulho que compromete nossa atuação pública fiel.


1. POYTHRESS, Vern S. O Senhorio de Cristo: servindo o nosso Senhor o tempo todo, em toda a vida e de todo o nosso coração. Trad. Marcelo Herberts. 1ª ed. Brasília: Editora Monergismo, 2019, p. 158-159.

2. Ibid., p. 165.

3. Ibid., p. 16-17.

4. Ibid., p. 31.

5. Ibid., p. 32.

6. Ibid., p. 159.

7. João 13.53: “Nisto todos conhecerão que sois meus discípulos, se vos amardes uns aos outros”. Disponível em: https://www.bibliaonline.com.br/acf/jo/13.

8. Mateus 12.25: “Jesus, porém, conhecendo os seus pensamentos, disse-lhes: Todo o reino dividido contra si mesmo é devastado; e toda a cidade, ou casa, dividida contra si mesma não subsistirá”. Disponível em: https://www.bibliaonline.com.br/acf/mt/12.


Referência

POYTHRESS, Vern S. O Senhorio de Cristo: servindo o nosso Senhor o tempo todo, em toda a vida e de todo o nosso coração. Trad. Marcelo Herberts. 1ª ed. Brasília: Editora Monergismo, 2019.