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À espera do fim

Escrito por Auriesley Lima de Almeida Júnior, estudante do Programa de Tutoria Essencial


Com a pandemia do Covid-19, declarada pela Organização Mundial de Saúde em 2020, os questionamentos acerca da possibilidade de extinção da raça humana voltaram a ocupar as reflexões e conversas. A falta de conhecimento histórico e a supervalorização da nossa própria geração impossibilitam a correlação da pandemia atual com várias outras que já sobrevieram à humanidade, como a peste-negra que assolou a Europa no século XIV.

Os debates acerca do que causará o fim da humanidade estão “a todo vapor”. Nas igrejas, a cada dia surgem teorias sobre o fim dos tempos. Todas as catástrofes são vistas como sinais que finalmente “autorizam” o retorno de Cristo. Versículos bíblicos descontextualizados são manipulados para servirem de prova às mais absurdas especulações.

Muitas vezes nos perdemos nesses debates inconclusivos e meramente especulativos porque não entendemos a importância das “coisas da Terra”, como chamou Joe Rigney (RIGNEY, 2017). Vivemos procurando sinais do fim, sem considerar nosso dever no mundo. Somos peregrinos e cidadãos dos céus, mas Deus não nos retira do mundo ato contínuo à nossa salvação, Ele nos mantém aqui, com um propósito.

Nesse sentido, as Escrituras deixam claro os diversos deveres que os cristãos têm como corregentes da criação. Somos chamados para atuarmos ativamente na restauração da ordem criacional afetada pelo pecado. Ser servo de Deus no mundo implica no cumprimento das ordenanças estabelecidas pelo Criador em cada área da vida. Assim, somos chamados a uma vida ética que reflita o caráter do Senhor e pelo nosso proceder muitos cheguem ao conhecimento da Verdade.

Assim, os Dez Mandamentos resumem a lei moral de Deus, presente no coração do homem desde sua criação e posteriormente ditado por Yahweh a Moisés no deserto. A obediência ativa às ordenanças requer um compromisso diário de se viver da forma que Deus requer. A aplicação dos mandamentos em cada aspecto da existência é uma forma de reestabelecer a ordem perfeita da criação. Muitas vezes desprezamos a importância da nossa vida cotidiana pautada pela ética cristã, supondo que a salvação só se dará com o fim do mundo tal qual conhecemos. Ignoramos que a redenção é progressiva e acontece desde que o pecado entrou no mundo e hoje já temos a salvação assegurada por meio da obediência ativa e passiva de Cristo e seu sacrifício vicário. 

A expectativa da volta de Cristo deve ser fundamentada nas Escrituras. A busca por sinais do fim dos tempos não pode tirar o foco de nossas obrigações diárias. Somos usados por Deus como pequenos instrumentos de sua redenção. Nossos deveres na Igreja, família e sociedade têm grande importância. Somos chamados diariamente a trazermos ordem em meio ao caos de um mundo caído. Em seu livro ética para viver melhor, C. S. Lewis, tratando das discussões quanto à possibilidade de destruição do mundo pós-criação da bomba atômica, diz:

Se vamos ser destruídos por uma bomba atômica, que ela nos encontre realizando atividades humanas sensatas — orando, trabalhando, ensinando, lendo, ouvindo música, dando banho nas crianças, jogando tênis, conversando com amigos enquanto bebemos ou jogamos dardos, e não amontoados como ovelhas apavoradas, pensando em bombas. Elas podem destruir o corpo (até um micróbio pode fazer isso), mas não precisam dominar nossa mente. (LEWIS, 2017, p. 170).

O autor nos ensina que as preocupações com catástrofes que possam dar fim à nossa vida não podem ocupar nossa mente ao ponto de ofuscar nosso dever diário de aplicar os mandamentos de Deus em cada atividade que realizarmos. Nossas atividades cotidianas têm valor para nosso Criador, pois Ele preparou de antemão boas-obras para que andássemos nelas.

O medo ou a expectativa do fim, seja por uma bomba atômica, seja por uma pandemia global, não podem tirar nosso foco do andar diário com Deus. Cada situação em que o Senhor nos coloca tem um valor e a forma como agimos nos coloca como instrumentos de redenção ou como violadores da ordem criacional. 

Sobre a importância do cumprimento de nossas obrigações diárias, Michael Horton nos ensina:

Devemos conquistar o direito de compartilhar o evangelho, e não podemos ganhar respeito pela nossa fé se ela for percebida como corruptora de nossas obrigações. Alguém perguntou a Lutero o que ele faria se soubesse que o Senhor voltaria no dia seguinte. O reformador respondeu, “Eu plantaria uma árvore”. (HORTON, 2000, p. 191).

Somos chamados a uma ética cristã aplicada a cada atividade cotidiana. Cumprindo essa missão, somos usados por Deus como instrumentos de redenção. O mundo sempre passará por catástrofes e situações preocupantes à vida do homem. Toda a ordem da criação foi afetada pelo pecado. Contudo, temos a obrigação de, como cidadãos dos céus, cumprirmos nossas obrigações diárias na Terra. Não sabemos o dia da volta de Cristo e não nos compete buscar sinais em cada acontecimento que nos sobrevêm, pois as coisas encobertas pertencem ao Senhor. Mas temos os seus mandamentos revelados, e andar por eles nos faz servos fiéis e instrumentos de redenção.


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Referências Bibliográficas

HORTON, Michael. A lei da perfeita liberdade: a ética bíblica a partir dos Dez Mandamentos. Tradução: Denise Meister. 1ª edição. São Paulo, SP: Cultura Cristã, 2000. 252 p.

LEWIS, C. S. Ética para viver melhor: diferentes atitudes para agir corretamente. Tradução: Cláudia Ziller. 1ª edição. São Paulo: Planeta, 2017. 254 p.