Artigo de opinião escrito por Gabriela Cristina Ferreira, estudante do Programa de Tutoria Essencial 2025
Se você é cristão e um usuário de rede social no ano de 2025, deve ter se deparado com algumas polêmicas e divergentes opiniões que certo conteúdo aflorou recentemente em nossos algoritmos. Pode-se elevar a situação para outro público, que não o cristão, devido à tamanha rapidez e alcance que gerou a questão das áreas vip em templos notáveis e detentores de certa fama em nosso país. Diante de muitas dúvidas e questionamentos a respeito, a mais evidente é a indagação: é correto igrejas terem áreas vip? Dentro disso, te convido a elaborarmos a ideia primária sobre isso, o pano de fundo: o que Cristo nos ensina a tendência à exclusividade?
Ao acompanharmos o drama das Escrituras, nos deparamos com a promessa de Deus em redimir o seu povo por meio do envio de Seu Filho como o único Sumo Sacerdote capaz de tomar sobre si os pecados do povo e ser o Mediador entre nós e Deus. Nesse sentido, vimos, então, o clímax desse drama culminado em Deus, na Pessoa de Jesus Cristo encarnado, vindo até nós e, assim, chegamos na sentença: um Deus se fazendo homem. Com efeito, tal fato revela para nós — ou ao menos deveria — o peso de alguém se despir de sua glória e adentrar um estado de humilhação em favor de homens que o rejeitaram desde o início, como confirma Geerhardus Vos: “Ele existiu como Messias num estado de humilhação” (VOS, 2019, p. 405).
Durante seu tempo na terra, Cristo passou por eventos que o prepararam para o fim de sua caminhada até a cruz. Um desses eventos se deu logo após seu batismo, quando “em seguida, Jesus foi conduzido pelo Espírito ao deserto para ser tentado pelo diabo” (Mt 4:1, NVT). O progresso da história se dá onde Cristo se encontra na posição de obediência e paciência, pois, “na experiência de Jesus, como na experiência cristã comum, o que é mais necessário acima de tudo é um espírito interior de submissão a Deus” (VOS, 2019, p. 407).
Assim também Vos (2019) enfatiza que existe um equívoco em lermos tal passagem através das nossas lentes interpretativas embaçadas pela queda. Nosso coração já inclinado ao pecado faz com que nosso objetivo ao passarmos pela tentação é não sermos vencidos por ela, enquanto para Cristo, somando a esse ponto, tem-se que “a preocupação maior não era evitar a perda, mas conseguir o ganho positivo” (VOS, 2019, p. 402), o qual muito se associa ao contraste em Adão, tornando Jesus nosso segundo Adão que foi fiel e obediente até o fim.
Mediante isso, temos como resultado Jesus optando pela “estrada difícil para o reino: a estrada do serviço humilde, do amor doador e do sofrimento sacrificial. O caminho de Jesus é o caminho da cruz” (BARTHOLOMEW e GOHEEN, 2017, p. 159). Compreendendo que esses valores perpassam por nós, cristãos leitores da Palavra, existe uma sensação incômoda que nos leva a questionar qual ou quem tem sido a fonte de ensino daqueles que têm confundido o evangelho e a fé cristã com estradas que levam ao exclusivismo, privilégios e notabilidades, ou até mesmo se colocarem nessas posições por permissões humanas.
A necessidade de entender a Bíblia como um livro a respeito de uma só história nos dá aparato para emergir no que foi a redenção. Um povo com o coração duro, inclinado ao mal e ao pecado, retornando aos velhos hábitos e se voltando a Deus em momentos de necessidade através do que Ele deixou como mediação para isso, sua Lei e Aliança. Então, como leitores, cansados desse padrão orgulhoso, perante um espelho dos nossos próprios tropeços, somos aliviados pelo encontro com o personagem principal, Deus na pessoa de Jesus sendo o único capaz de cumprir a Lei em serviço ao Pai e ser a figura vital no plano da redenção por meio de humildade, paciência e grande humilhação, para então ser exaltado.
Posto isto, existe um distanciamento enorme entre o que há na Palavra sobre a essência do Evangelho e o que se encontra em alguns frequentadores de templos que se assemelha ao povo que subverteu a mensagem de Jesus. Podemos encontrar uma razão para isso nos ensaios de C. S. Lewis (2017), onde ele traz a ideia de uma massa que aceita e vê Jesus apenas como um grande mestre da moral, o descaracterizando de sua própria natureza. O reino de Deus revela um mundo invertido:
As coisas que o mundo coloca no fim da lista estão no topo da lista do reino de Deus. E as coisas tidas como suspeitas aos olhos do reino de Deus são valorizadas pelo reino deste mundo. O que está no topo da lista do reino deste mundo? Poder e dinheiro […], sucesso e reconhecimento. Mas o que está no topo da lista do reino de Deus? Fragilidade e pobreza […], sofrimento e rejeição. A lista do reino de Deus é invertida (KELLER, 2018, p. 216).
Como, então, nos envolvermos com padrões que fazem parte da lista deste mundo quando sabemos que o exemplo que devemos seguir foi aquele que Cristo viveu em conformidade ao Pai? Aquele que já estava presente na criação do universo, envolto por glória e honra, em um relacionamento de comunhão com o Pai, se fez homem, se despiu daquilo que sempre fez parte da sua essência, para entrar em um campo de batalha que Adão falhou e nós falhamos. Contudo, ele permaneceu fiel até o fim, pois “Cristo entregou-se e humilhou-se de forma perfeita: perfeita porque ele era Deus, entregou-se e humilhou-se porque era homem” (LEWIS, 2017, p. 95). Não existe concordância na busca pelo renome e notoriedade e o Evangelho. Com Jesus, podemos entender que o próprio cedeu glória em favor de nós. Como, então, nos sentimos conformados com essa necessidade de exclusividade e repartições dentro de nossas próprias igrejas? Não é mera interpretação bíblica, é a Bíblia – o ensino puro e simples de Cristo às nossas vidas.
O caminho até o Gólgota não foi marcado por brilhantismo, elogios e felicitações. Foi marcado por dor, vergonha, ofensas e humilhações. O espaço para pessoas desprezíveis e não importantes foi levantado com Aquele que é a importância última, contudo, não com aplausos e exclusividade, mas com xingamentos, deboches e zombaria. O local vip reservado para os que pagam ou merecem estar por prestígio e privilégio não foi o mesmo onde Jesus foi pendurado. Existiu, sim, um lugar exclusivo para Ele: no Gólgota, em uma cruz, que simbolizava humilhação. Esse lugar foi tomado pelo Deus homem não para ser adorado, mas para ser abandonado pelo próprio Pai e sofrer em sua alma a separação com a glória e amor de Deus.
O Evangelho não se desenvolveu em conforto e moralismos; é uma Pessoa que, para aliviar a nossa culpa e nosso pecado, se fez humilde, obediente e paciente e é nessa verdade que devemos nos basear, não em grupos ou pessoas que se autointitulam importantes, mas na figura principal desse drama que fazemos parte: Jesus Cristo, o Filho de Deus.
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Referências bibliográficas
BARTHOLOMEW, Craig G.; GOHEEN, Michael W. O drama das Escrituras: encontrando o nosso lugar na história bíblica. Tradução: Daniel Kroken. São Paulo: Vida Nova, 2017.
BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Nova versão transformadora. São Paulo: Mundo Cristão Editora. 2016.
KELLER, Timothy. A cruz do rei: a história do mundo na vida de Jesus. Tradução: Marisa K. A. de S. Lopes. São Paulo: Vida Nova, 2018.
LEWIS, C. S. Cristianismo puro e simples. Tradução: Gabriele Greggersen. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017.
VOS, Geerhardus. Teologia bíblica: Antigo e Novo Testamentos. Tradução: Alberto Almeida de Paulo. São Paulo: Cultura Cristã. 2 ed. 2019.