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Criação, Queda, Redenção e Câncer

Artigo escrito por Aleyde Diniz Loureiro, estudante do Programa de Tutoria Essencial 2024


“(…) a nossa fé está num Deus que veio resgatar a sua criação do absurdo do pecado, do vazio e do desperdício da morte, das forças — quer a malícia planejada, quer o acaso imbecil — que esmagam almas vivas; e então temos a permissão de odiar essas coisas em um ódio perfeito.”

(Hart apud Warren, 2021, p. 155)

Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), estima-se que no triênio de 2023 a 2025 haverá o diagnóstico de 704 mil casos de câncer por ano no país1. Trata-se de um grupo de doenças diversas com etiologia complexa e fatores de risco ainda não muito plenamente entendidos pela medicina. Ainda hoje, é um diagnóstico que assombra nosso imaginário como população e que se associa a imagens vívidas de dor e sofrimento e, com muita frequência, morte. Diante disso, como compreender a existência de algo tão devastador sem adotar uma postura niilista da vida? 

Não obstante, é através da nossa cosmovisão que damos sentido ao mundo. Segundo James W. Sire, em seu livro Dando nome ao elefante, “cosmovisão é um conjunto de pressuposições (suposições que podem ser verdadeiras, parcialmente verdadeiras ou totalmente falsas) sustentamos (consciente ou subconscientemente, consistente ou inconsistentemente) sobre a constituição básica de nosso mundo” (SIRE, 2015, n.p.). Mas, o que a cosmovisão cristã nos ensina que pode nos ajudar a navegar em meio à incerteza e sofrimento e, eventualmente, morte que o câncer traz à vida de seu portador e àqueles que o amam?

No livro Introdução a cosmovisão cristã, Michael W. Goheen e Craig G. Bartholomew advogam que encontramos na grande narrativa bíblica — criação, da queda e da redenção — as respostas para as grandes perguntas que afligem o ser humano (Quem somos? Por que vivemos? O que há de errado com o mundo?). Segundo os autores, a Bíblia nos mostra um Deus de amor atuando na história para redimir todas as coisas e nos conduzir a uma eternidade em Sua presença:

Deus está agindo com amor e poder para restaurar uma criação caída (mas essencialmente boa), para que ela torne a viver debaixo do governo bom e gracioso dele. Deus está novamente se tornando rei. No anúncio da chegada do reino temos o grande enredo do drama das Escrituras: (1) Deus (em Cristo e pelo Espírito) cria o mundo; (2) o pecado debilita, deturpa e arruína a criação; (3) Deus age para curar, endireitar e restaurar; (4) Deus finalmente reconcilia todo o cosmo consigo mesmo. (…) O enredo principal da Bíblia é a narrativa de como Deus restaura uma criação que tinha sido desfigurada pelo pecado: em primeiro lugar vem a Criação seguida pela Queda e, depois disso, vem a restauração (GOHEEN; BARTHOLOMEW, 2016, p. 62).

Em contrapartida, o câncer nos mostra nossa vulnerabilidade, nos confronta com nossa mortalidade e finitude e grita que não seremos capazes de vencer este inimigo através dos avanços da ciência e da tecnologia. É bem verdade que avanços consideráveis foram feitos nesta seara e hoje muitas destas patologias são curáveis e novas drogas permitiram diminuir a toxicidade do tratamento ou aliviar os efeitos colaterais da quimioterapia. No entanto, o câncer segue como uma sombra que nos espreita do escuro e sussurra, como o crocodilo do capitão Gancho em Peter Pan, que nosso tempo está acabando.

Assim, precisamos, então, nos lembrar de Gênesis 3 e seu propósito: “O propósito de Gênesis 3-11 é em parte mostrar como o mundo se tornou tão rapidamente sombrio como resultado do pecado de Adão e Eva” (GOHEEN; BARTHOLOMEW, 2016, p. 81). Deus criou um mundo perfeito, sem doenças ou calamidades, mas o grito de independência de Adão e Eva no jardim do Éden nos fez conhecer a morte, a dor e o sofrimento. Neste ato de desobediência, toda a ordem criacional ruiu e aguarda com grande expectativa sua restauração futura. John Lin, no Catecismo da Nova Cidade, coloca:

Não viver tendo Deus como referência não apenas conduz à nossa morte e à desintegração pessoal; é a razão pela qual todo o cosmo está sujeito à morte e à desintegração. Deus criou Adão e Eva para serem o cerne e o pináculo da criação. No entanto, quando eles pecaram, a desobediência em relação à amorosa lei de Deus teve implicação não somente sobre suas vidas, como também sobre a vida de todo o cosmo (LIN in HANSEN, 2017, p. 79).

Nesse sentido, a cosmovisão cristã nos ensina que o problema do mundo é o pecado advindo da Queda, mas que ele e seus efeitos para a criação têm prazo de validade. A redenção já foi iniciada na cruz de Cristo e sua consumação se aproxima quando tudo será restaurado e o governo será posto aos pés de Cristo. Portanto, Deus está no controle da história humana e todo sofrimento terreno é transitório. A cura do nosso único mal, o pecado, já nos foi dada. Não nos custou nada, mas na cruz de Cristo temos garantido um futuro sem choro, sem dor, desfrutando da presença de Deus em uma criação restaurada à sua ordem criacional. Assim, diante do câncer, uma das muitas formas de sofrimento deste mundo caído, precisamos olhar para o alto e manter os olhos fixos em Cristo, pois nossa esperança não é deste mundo, não é perecível e não tarda.

“Agora o tabernáculo de Deus está com os homens, com os quais ele viverá. Eles serão os seus povos; o próprio Deus estará com eles e será o seu Deus. Ele enxugará dos seus olhos toda lágrima. Não haverá mais morte, nem dor, pois a antiga ordem já passou” (Ap 21:3-4 NVI).


1INSTITUTO NACIONAL DE CÂNCER (INCA). Estimativa 2023: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro. INCA. 2022. Disponível em: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files//media/document/estimativa-2023.pdf. Acesso em 27 abril 2024.


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Referências bibliográficas

GOHEEN, M. W. Introdução à cosmovisão cristã: vivendo na intersecção entre a visão bíblica contemporânea. Tradução: Marcio Loureiro Redondo. São Paulo. Editora Vida Nova.2016.272p

HANSEN, C. Devocional do catecismo nova cidade: a verdade de Deus para nossos corações e mentes. Tradução: Elizabeth Gomes. São Paulo. Editora Fiel.2017. 238 p.

INSTITUTO NACIONAL DO CÂNCER (INCA). Estimativa 2023: incidência de câncer no Brasil. Rio de Janeiro. INCA. 2022. Disponível em: https://www.inca.gov.br/sites/ufu.sti.inca.local/files//media/document/estimativa-2023.pdf. Acesso em 27 abril 2024.

SIRE, J. W. Dando nome ao elefante: cosmovisão como um conceito. Monergismo, 2015. 186 p. E-book. Disponível em: https://www.amazon.com.br//Dando-Nome-Elefante-James-Sire/dp/8562478563

WARREN, T. Oração da noite: para quem trabalha, vigia ou chora. Tradução: Guilherme Cordeiro Pires. 1ed. São Paulo. Editora Pilgrim. 2021. 256 p.