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Em defesa da disciplina eclesiástica

Artigo escrito por Gustavo Breternitz Lino, estudante do Programa de Tutoria Essencial 2024


Amplamente narrados na Bíblia, os trechos que falam sobre disciplina clarificam o objetivo que Deus tem para corrigir seus filhos, conforme um conhecido verso do livro de Hebreus diz: “Nossos pais nos disciplinavam por curto período, segundo lhes parecia melhor; mas Deus nos disciplina para o nosso bem, para que participemos da sua santidade” (Hb.12:10). Em seu livro 9 marcas de uma igreja saudável1, Mark Dever conclui que a disciplina eclesiástica é uma dessas marcas, definindo-a como a simples obediência a Deus e o reconhecimento de que precisamos de ajuda para desenvolver nossa santidade de forma que reflita a santidade de Deus. Apesar da disciplina eclesiástica ser uma clara característica de igrejas saudáveis, ela é cada vez mais deixada de lado e menos discutida nas igrejas modernas. Quais poderiam ser alguns dos motivos para isso?

Um primeiro motivo é que líderes e membros de igrejas temem confrontar uns aos outros, receosos de criar conflitos dentro da comunidade e de que a prática da disciplina resulte na saída de membros da igreja. A saída de membros, por sua vez, pode abalar a imagem das igrejas que desejam ser amorosas e acolhedoras e afetar as contribuições financeiras que sustentam a estrutura da igreja e, por vezes, a própria liderança.

Um segundo motivo é a cultura atual que valoriza a tolerância e a aceitação, o que pode fazer com que a disciplina seja vista como algo intolerante ou severo. Há também um equívoco bíblico de que não se deve julgar ou corrigir o comportamento dos outros, pois Jesus ordenou que seus discípulos não julgassem2. Por último, um terceiro motivo é o entendimento incorreto do amor e da graça de Deus que pode resultar na falta de correção, acreditando que falar sobre o pecado ou disciplinar é contrário a estes atributos divinos. Qual, então, é a proposta apresentada pela Bíblia para a disciplina eclesiástica? A Bíblia mostra que a disciplina é um processo com etapas claras e comunitário, começando com uma abordagem individual e escalando para envolver a igreja inteira, se necessário.

Se o seu irmão pecar contra você, vá e, a sós com ele, mostre-lhe o erro. Se ele o ouvir, você ganhou seu irmão. Mas se ele não o ouvir, leve consigo mais um ou dois outros, de modo que ‘qualquer acusação seja confirmada pelo depoimento de duas ou três testemunhas’. Se ele se recusar a ouvi-los, conte à igreja; e, se ele se recusar a ouvir também a igreja, trate-o como pagão ou publicano (Mt.18:15-17).

O objetivo é restabelecer e reconciliar. A disciplina é uma demonstração de amor e responsabilidade compartilhada, que busca o bem-estar espiritual da pessoa e da comunidade. Evitar a correção por medo de conflitos ou perda de membros é, na verdade, uma forma de negligência espiritual. Conforme define o Capítulo I do Manual Presbiteriano sobre o Código de Disciplina3:

Art. 2º Disciplina eclesiástica é o exercício da jurisdição espiritual da igreja sobre seus membros, aplicada de acordo com a Palavra de Deus.

Parágrafo único. Toda disciplina visa edificar o povo de Deus, corrigir escândalos, erros ou faltas, promover a honra de Deus, a glória de Nosso Senhor Jesus Cristo e o próprio bem dos culpados.

O apóstolo Paulo ensina que a igreja tem a responsabilidade de julgar e disciplinar os membros que vivem em pecado. Isto não se trata de uma atitude de intolerância, mas, sim, de manter a pureza e a santidade da comunidade de crentes. A sua primeira carta aos coríntios registra as passagens mais extensas sobre este assunto. O capítulo 5 conclui explicitamente falando sobre esta responsabilidade: “(…) não devem vocês julgar os que estão dentro? Deus julgará os de fora. Expulsem esse perverso do meio de vocês” (1Co 5:12b-13). Vale lembrar que a correção deve ser feita com um espírito de mansidão e humildade, conforme Gálatas 6:1. A verdadeira aceitação e tolerância na igreja não significa ignorar o pecado, mas abordar o pecado com amor e desejo de cura. O texto já citado de Hebreus 12:10, e sua continuação no verso 11, nos lembra que a disciplina é uma prova do amor de Deus. De forma semelhante a um pai amoroso que corrige seus filhos, Deus corrige seus filhos para o bem deles, buscando gerar fruto de justiça e paz.

A disciplina eclesiástica, longe de ser um ato de intolerância ou severidade, é uma expressão do amor e da graça de Deus. É um meio pelo qual a igreja mantém sua pureza, promove a santidade entre seus membros e busca a restauração daqueles que estão no pecado. A Bíblia oferece uma base clara para a prática da disciplina, destacando sua importância e benefícios. Implementar a disciplina eclesiástica da forma correta é essencial para as igrejas bíblicas e saudáveis. Como diz o teólogo holandês Herman Bavinck, “a disciplina é um meio dado por Cristo à igreja para que ela preserve essa natureza santa”. (BAVINCK, 2021, p. 626).


1DEVER, Mark. 9 marcas de uma igreja saudável. Tradução: Francisco Wellington Ferreira. 1ª ed. São José dos Campos: Editora Fiel, 2007, p. 211.

2Em Mateus 7:1 Jesus diz: “Não julguem, para que vocês não sejam julgados”. “Julgar” aqui não se refere a qualquer tipo de discernimento ou avaliação, como o voltado à disciplina, mas a um julgamento hipócrita, crítico e condenatório, é este que Jesus está condenando.

3IGREJA PRESBITERIANA DO BRASIL. Manual Presbiteriano. São Paulo: Cultura Cristã, 2023, p. 168.


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Referências Bibliográficas

BAVINCK, Herman. As maravilhas de Deus: instrução na religião cristã de acordo com a confissão reformada. Tradução de David Brum Soares. 1ª ed. São Paulo: Pilgrim Serviços e Aplicações; Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2021. 736 p.

BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada Leitura Perfeita: Nova Versão Internacional. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2019. 1184 p.

DEVER, Mark. 9 marcas de uma igreja saudável. Tradução: Francisco Wellington Ferreira. 1ª ed. São José dos Campos: Editora Fiel, 2007. 307 p.

IGREJA PRESBITERIANA DO BRASIL. Manual Presbiteriano. São Paulo: Cultura Cristã, 2023. 560 p.