Artigo escrito por Marcela Moreira Marques e Souza, estudante do Programa de Tutoria Essencial 2024
Na oração sacerdotal, Jesus disse que a vida eterna, ou seja, a totalidade da salvação, consiste no conhecimento do Deus verdadeiro e de Jesus Cristo, a quem Deus enviou1. Portanto, pode-se dizer que o objetivo principal de um pai crente em relação ao seu filho deve ser que ele conheça a Deus e a Jesus Cristo. A princípio, o “conhecimento de Deus” não nos parece nenhum absurdo, pois é uma expressão comum na vida religiosa cristã. Porém, isso realmente deveria nos assombrar: “Como o homem pode conhecer a Deus, o Infinito e Incompreensível, aquele que não pode ser medido nem pelo tempo nem pela eternidade”?2
O conhecimento de Deus difere de qualquer outro conhecimento. Podemos conhecê-lo somente à medida que Ele escolhe se revelar3. Ao mesmo tempo, conhecer envolve mais do que simples informação, um saber impessoal, mas “o conhecimento real inclui um elemento de interesse e envolvimento pessoal e uma atividade do coração”4. A esse conhecimento verdadeiro Bavinck atribui o nome de “conhecimento da fé”5.e nos fornece uma vívida explicação: “De fato, conhecer a Deus não consiste em saber um monte de coisas sobre ele, mas sim em ver o Senhor na pessoa de Cristo, encontrá-lo no caminho da nossa vida e, na experiência das nossas almas, conhecer suas virtudes, sua justiça e sua santidade, e também sua compaixão e sua graça”6.
A epístola de Tiago resume bem as implicações de um conhecimento de Deus estritamente informativo: “Crês, tu, que Deus é um só? Fazes bem. Até os demônios creem e tremem”7. Por outro lado, não se pode desprezar a instrução racional, uma vez que ela vem primeiro: “a fé vem pela pregação, e a pregação, pela palavra de Cristo”8. Jesus une “fé” e “razão” no maior mandamento: “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força”9.
Segundo Tedd Tripp, o objetivo de um pai sábio em relação ao filho é “demonstrar o frescor e a vitalidade de uma vida dedicada integralmente a Deus e a sua família”10. Assim, podemos dizer que esse “conhecimento da fé” é a chave para a formação de uma cosmovisão bíblica nos nossos filhos, é a união de dois esforços: instruir e encarnar essas verdades.
Quando observamos o desenvolvimento do conhecimento de Deus do povo de Israel, ou seja, o progresso da revelação, pode-se perceber que o povo muitas vezes é comparado a uma criança:
No deserto, e posteriormente em Canaã, Israel constantemente exibe a natureza de uma criança. Esse povo não era um povo sensato e racional; careceu de autoconsciência, de espírito de discernimento, de uma mente filosófica e do poder do pensamento abstrato. Era, portanto, um povo de sentimento e emoção.11
A revelação de Deus não se deu de uma só vez, mas se desdobrou ao longo de uma série de atos sucessivos12. Ela não foi apenas progressiva com a História, mas é encarnada na História, pois os próprios fatos adquiriam significado revelador13. Há, portanto, um crescimento orgânico do conhecimento de Deus dentro de um pacto, muito semelhante ao proporcionado pelo ambiente familiar14:
Porque Deus deseja ser conhecido dessa maneira, ele fez que sua revelação acontecesse no meio da vida histórica de um povo. O ambiente da revelação não é uma escola, mas um “pacto”. Falar sobre a revelação como uma “educação” para a humanidade é uma maneira racionalista e não escriturística de falar. Tudo o que Deus desvendou de si mesmo veio em resposta às necessidades religiosas práticas de seu povo à medida que essas emergiam no curso da História.15
Assim como o povo de Israel recebeu a revelação de Deus adaptada às suas necessidades religiosas, o pai deve estar atento ao desvendamento de novas percepções religiosas de seu filho. Conforme diz o apóstolo Paulo em sua carta aos Filipenses, “andemos de acordo com o que já alcançamos”. O próprio Deus utilizou de diversas formas para se revelar, não somente pela história, mas também pela lei e, posteriormente a profecia, os salmos e a literatura de sabedoria.
Por outro lado, não podemos esquecer que toda a revelação de Deus tem seu cumprimento máximo em Jesus Cristo. Então, embora possa haver certa adaptabilidade da forma da revelação, todas elas devem conduzir a criança a Cristo, ou seja, devemos “proclamar alguma faceta da pessoa, da obra ou do ensino de Jesus de Nazaré, para que as pessoas possam crer nele, confiar nele, amá-lo e obedecê-lo”.17
Por fim, o conhecimento de Deus não é de caráter estritamente racional, mas também uma verdade encarnada em amor ao nosso Senhor. A instrução racional sem a encarnação nos revela como hipócritas diante das crianças. Já a encarnação sem a instrução exclui nossos filhos de compreenderem a motivação por trás das nossas ações e decisões. Toda instrução e toda a encarnação deve conduzir o olhar de nossas crianças a Cristo, pois Ele é a fonte de todo verdadeiro conhecimento de Deus.
1BAVINCK, Herman. As maravilhas de Deus: Instrução na religião cristã de acordo com a Confissão Reformada. Tradução: David Brum Soares. 1ª edição, São Paulo. Editora Thomas Nelson Brasil. 2021, p. 53.
2Ibid., p. 55.
3VOS, Geerhardus. Teologia Bíblica: Antigo e Novo Testamentos. Tradução: Alberto Almeida de Paula. São Paulo. Cultura Cristã. 2010, p. 13. Edição do Kindle.
4BAVINCK op. cit., p. 55.
5Ibid., p. 57.
6Ibid., p. 57.
7Tiago 2:9, ARA.
8Romanos 10:17, AR
9Marcos 12:30, ARA.
10TRIPP, Tedd. Pastoreando o coração da criança. Tradução: Ângela Guerrato. São José dos Campos. 2ª edição, Editora Fiel. 2017, p. 12. Edição do Kindle.
11BAVINCK, 2021, p. 121.
12VOS, 2010, p. 16.
13Ibid., p. 17.
14Ibid, p. 17.
15Ibid., p. 19.
16Filipenses 3:16, ARA.
17STOTT, John apud GREIDANUS, Sidney. Pregando Cristo a partir do Antigo Testamento: Um método hermenêutico contemporâneo. Tradução: Elizabeth Gomes. 2ª edição. São Paulo. Editora Cultura Cristã. 2019. p. 91. Edição do Kindle.
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Referências bibliográficas
BAVINCK, Herman. As maravilhas de Deus: Instrução na religião cristã de acordo com a Confissão Reformada. Tradução: David Brum Soares. 1ª edição, São Paulo. Editora Thomas Nelson Brasil. 2021, p. 53-121.
BÍBLIA SAGRADA. Trad. João Ferreira de Almeida. Almeida Revista e Atualizada. 2ª Edição. Sociedade Bíblica do Brasil. 1993.
TRIPP, Tedd. Pastoreando o coração da criança. Tradução: Ângela Guerrato. São José dos Campos. 2ª edição, Editora Fiel. 2017, p. 12. Edição do Kindle.
GREIDANUS, Sidney. Pregando Cristo a partir do Antigo Testamento: Um método hermenêutico contemporâneo. Tradução: Elizabeth Gomes. 2ª edição. São Paulo. Editora Cultura Cristã. 2019. p. 91. Edição do Kindle.
VOS, Geerhardus. Teologia Bíblica: Antigo e Novo Testamentos. Tradução: Alberto Almeida de Paula. São Paulo. Cultura Cristã. 2010, p. 13-19. Edição do Kindle.