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Um amor que protege: por que a suficiência das Escrituras apresenta um cuidado maior e melhor em comparação ao que o Feminismo oferece?

Artigo de opinião escrito por Alice Affonso Sacoman, estudante do Pocket Essencial 2024


“Dona de mim”. Lembro que essa música cativou muitas mulheres, fazendo grande sucesso nas mídias brasileiras, quando foi lançada pela cantora Iza, no ano de 2018. Seu nome é um dos repetidos bordões ditos por jovens e mais velhas, junto a outras frases como: “lugar de mulher é onde ela quiser”, ou “meu corpo, minhas regras”. Mas, de onde vem a segurança de afirmar que o meu lugar é onde eu quero? Por que ser “dona de mim” deveria inspirar segurança? E qual a pressuposição que garante que, tendo um corpo como parte de mim, sou capaz de julgar o que é certo fazer com ele? 

Assim como já foi para mim um dia, as respostas a essas três perguntas podem parecer bastante simples e até “lógicas”: nada melhor do que cuidar de si mesma e reivindicar os próprios direitos, em vez de terceirizar seu cuidado a outro. No entanto, pela perspectiva bíblica, essa é uma afirmação errônea, e até ingênua. Em função da Queda, nosso coração foi corrompido, distanciou-se do Criador e é enganoso1 — não sabemos o que é melhor para nós mesmos. Qualquer migalha de autossuficiência é ilusória. Dito isso, como responder, então, a essas e outras questões?

Para o alívio de muitos, há alguém em quem se pode confiar e ter plena segurança de que não falhará conosco, o qual dá a direção correta a essas perguntas, a saber, Jesus Cristo. Necessitamos dessa verdade para tudo em nossas vidas. E uma das formas de transmitir esse fato às pessoas é, sem dúvidas, através do Aconselhamento Bíblico: A Palavra é suficiente para prover segurança e cuidado em meio aos medos e faltas que permeiam o mundo quebrado pelo pecado, em contraste aos direitos e proteção que movimentos como o feminismo alegam garantir. Pode-se ver isso percorrendo os atributos de Deus2 e a doutrina da imagem de Deus nas Escrituras3.

Falando da Lei dada ao povo da Aliança, por exemplo, creio que todos os crentes fiéis concordam com Jesus quando Ele a resume nos dois grandes mandamentos: “Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força” (Mc 12.30) e “amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mc 12.31). No entanto, poucos buscam entender o porquê ela é resumida dessa forma.

No Antigo Testamento, em Ex 20.2-17, e similarmente em Dt 5.6-21, encontramos o Decálogo, popularmente conhecido como “Os Dez Mandamentos”. Talvez, ele seja “[…] o projeto de direitos mais antigo do mundo. Mas esses direitos servem a quem?”4. A declaração com a qual ele começa dirigindo-se ao povo de Israel, “Eu sou YHWH, teu Deus, que te tirei da casa do Egito, da casa da servidão”, e todos os mandamentos seguintes, mostram que alianças são baseadas em relações pessoais. Daniel Block ainda afirma que “os dois primeiros mandamentos protegem os direitos de YHWH, e o restante protege os direitos das outras pessoas”5

Em suma, o Decálogo nos responsabiliza a resistir buscar nossas próprias vantagens à custa de outros e buscar o interesse dos outros acima dos nossos. Nesse contexto, ainda em concordância com Block (2018), entra o significado bíblico de amor (ahab, do hebraico, e agapao, do grego), presente tanto no Antigo quanto no Novo Testamento: demonstrar compromisso de aliança através de ações que servem o interesse e bem-estar do próximo6. É por isso que toda a Lei é resumida nos dois mandamentos mencionados acima. E é isso que Deus demonstrou pelo mundo ao dar seu único Filho, oferecendo sua vida pelos pecadores. 

Com isso, vemos que em toda a Escritura, inclusive na instituição do Decálogo, Deus mostra primeiro o indicativo de quem Ele é – um Pai amoroso que cuida de seus filhos e fez uma aliança com eles – e o que Ele fez por seu povo, para então podermos responder, de forma fiel e alegre, aos imperativos que Ele dá em sua Palavra. “As leis são um novo modo de vida em resposta a isso” (DULCI, 2024). Buscamos uma vida de obediência à Palavra perante a consciência de que o Evangelho oferece esperança verdadeira e fiel no mundo caído. E devemos proceder da mesma forma – apresentar os indicativos e os imperativos da Palavra – quando ministramos conselhos e buscamos ajudar alguém em seus dilemas.

Finalmente, atrelando essas características das Escrituras ao feminismo, quando olhamos para as motivações de mulheres que, por falta de um entendimento amplo e correto de quem Deus é, buscam sentido e auxílio para suas questões dentro do movimento feminista (até mesmo na esfera cristã), reconhecemos que muitas são válidas, como buscar amor, respeito, cuidado, segurança, alento e valor. No entanto, quando essas motivações são demasiadamente desejadas, elas se tornam ídolos, por meio dos piores males deste mundo: egoísmo e orgulho. Vemos isso quando mulheres reivindicam o direito de tirar a vida de outro por meio do aborto e ao buscarem se igualar, ou então, com ira pecaminosa, serem superiores aos homens, ignorando completamente os desígnios que Deus as deu enquanto portadoras da imagem divina – nesses exemplos específicos, principalmente como mães e esposas. 

Além disso, não se pode negar que há muitas injustiças para com as mulheres neste mundo, assim como há com homens e crianças. O feminismo é uma resposta a um problema real, mesmo que seja uma resposta incorreta, em nossa perspectiva enquanto cristãos. Porém, como afirmou Francine Walsh, “[…] se sentimos a necessidade de nos autodominar feministas para defender a mulher de injustiças, é porque ainda não compreendemos que Deus e sua Santa Lei são inteiramente suficientes para realizar essa tarefa”7.

Nenhum movimento ideológico, nenhum homem politicamente correto e nem o grupo mais empenhado de mulheres irá suprir as lacunas e sofrimentos que as mulheres enfrentam, e muito menos trazer soluções e consolos efetivos frente aos problemas da vida, pois esses problemas provêm da imagem quebrada de Deus no mundo, descrita nas páginas da Bíblia. Nas palavras de Lambert:

É a imagem de Deus no homem, até mesmo no mundo caído, que é o fundamento para a santidade da vida humana […] Nós demonstramos que a imagem de Deus está quebrada em nós toda vez que pensamos o que não deveríamos, não obedecemos como deveríamos, não amamos a Deus e ao próximo como deveríamos ou não cuidamos da criação da forma que deveríamos. Em resumo, nós vemos a imagem de Deus desfigurada em todos esses lugares onde o pecado distorce a forma como fomos criados para operarmos. O propósito da vinda de Jesus Cristo é restaurar a imagem deformada na humanidade caída. Jesus Cristo é a imagem perfeita de Deus (Lambert, 2017, p. 206).

AiImago Dei8 está em todo ser humano, não é algo que escolhemos ter ou não. O que muda é se reconhecemos essa verdade e buscamos respondê-la de forma que honre a Ele, com fé em Jesus, ou se ignoramos, dando lugar ao pecado. 

Os problemas do mundo surgem, incluindo aqueles que ecoam de forma mais direta nas mulheres, porque houve uma falha em espelharmos a Deus no relacionamento nosso com Ele e para com o próximo – o cerne do resumo da Lei, citado anteriormente. Sempre sofremos as consequências do fracasso em espelhar essa imagem, seja quando somos nós que a quebramos, seja quando outra pessoa a quebra e acaba por nos atingir. É por essa razão que somente Jesus e sua Palavra responde corretamente a cada uma das faltas e dilemas que dessa realidade provém, seja por meio do Decálogo e Salmos no AT, dos Evangelhos ou das cartas do apóstolo Paulo no NT. “Examinais as Escrituras, porque julgais ter nelas a vida eterna, e são elas mesmas que testificam de mim [Jesus]” – Jo 5.39. Essa suficiência em todo o Cânon Bíblico é a base para um aconselhamento redentivo. 

Assim, respondendo às perguntas feitas no início do texto: não sou dona de mim (e graças a Deus por isso). Meu lugar não é onde eu quero e não sou eu quem cria regras para meu corpo. Quem diz qual o meu lugar e quem eu sou é Deus. Somente Ele pode ditar as orientações e conselhos que devem responder adequadamente a essas perguntas e guiar todos os aspectos da vida. Porque é Ele que nos criou. Ele nos conhece completamente e nos ama com amor profundo. Ele é a fonte de toda a Beleza, Justiça e Bondade. Devemos mostrar isso às pessoas! E o papel de levar a esperança das boas-novas de Deus a elas é não somente de teólogos e conselheiros formais, sejam estes homens ou mulheres, mas, eminentemente, de todo cristão.

Portanto, que possamos, através de nossas vidas e palavras, apresentar a condição humana caída em que estamos e, ao mesmo tempo, a esperança na obra de Jesus Cristo. Como afirmou Vanhoozer, conselheiros e teólogos “curam almas […] por meio da administração de uma dose da realidade que o altera: a boa-nova de que Deus ressuscitou Jesus dentre os mortos e de que nós também podemos ser ressuscitados em Cristo”9. Em oposição às promessas ilusórias e mentiras que a cultura contemporânea nos seduz a aceitar como seguras – como as do feminismo – temos toda a Palavra para indicar a cada indivíduo o que o Senhor fez em Cristo e quem Ele é, nos permitindo assim também entender quem nós somos Nele, como portadores de sua imagem no mundo.

E a nós, mulheres, minha oração é que sempre possamos lembrar de que não é o feminismo (ou até mesmo o outro extremo da feminilidade conservadora e moralista) que nos agrega valor ou nos traz segurança num mundo imperfeito. Somente o que Ele nos deixou nas Escrituras pode nos guiar. Como Lambert afirma, a Bíblia ensina que Deus é terno e firme, cuidador e forte. Temos um Pai que é poderoso e gentil! É dele que precisamos acima de tudo. Apenas o Santo Amor de Deus, em Cristo Jesus, por meio do Espírito Santo, é que nos justifica e protege. Amém?


1 “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto; quem o conhecerá? Eu, o SENHOR, esquadrinho o coração, eu provo os pensamentos; e isto para dar a cada um segundo o seu proceder, segundo o fruto das suas ações.” – Jr 17.9-10.

2 Heath Lambert aborda a doutrina de Deus categorizando-a em: Atributos de Deus de Força e Atributos de Deus de Cuidado. LAMBERT, Heath. Teologia do aconselhamento bíblico: fundamentos doutrinários do ministério de aconselhamento. Tradução: Airton Williams Vasconcelos Barboza. 1. ed. Eusébio, CE: Editora Peregrino, 2017. p. 113-148.

3 Ibid., p. 197-232.

4 BLOCK, Daniel I. Para a glória de Deus: resgatando uma teologia bíblica do culto. Tradução: Thiago Machado Silva. 1 ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2018. p. 92.

5 Ibid., p. 93.

Ibid., p. 94.

7 WALSH, Francine Veríssimo. Ela à imagem Dele: A identidade feminina à luz Mundo Cristão, 2024. p. 52.

8 Expressão do latim utilizada para se referir à doutrina bíblica de que os seres humanos foram criados à imagem e semelhança de Deus.

9 VANHOOZER, K. J. e STRACHAN, Owen. O pastor como teólogo público: recuperando uma visão perdida. Tradução: Marcio L. Redondo. 1 ed. São Paulo: Vida Nova, 2016, p. 144.


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Referências Bibliográficas

BÍBLIA SAGRADA. Almeida Revista e Atualizada. 2. ed. Barueri, SP: Sociedade Bíblica do Brasil, 2009. 1664 p.

BLOCK, Daniel I. Para a glória de Deus: Resgatando uma teologia bíblica do culto. Tradução: Thiago Machado Silva. 1 ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2018. 432 p.

DULCI, Pedro. AULA 9.5 – A vida cotidiana como culto: A expressão ética da adoração. Invisible College. Brasil, 2024. 1 vídeo (08:28).

LAMBERT, Heath. Teologia do aconselhamento bíblico: fundamentos doutrinários do ministério de aconselhamento. Tradução: Airton Williams Vasconcelos Barboza. 1. ed. Eusébio, CE: Editora Peregrino, 2017. 365 p.

VANHOOZER, K. J. e STRACHAN, Owen. O pastor como teólogo público: Recuperando uma visão perdida. Tradução: Marcio L. Redondo. 1 ed. São Paulo: Vida Nova, 2016. 256 p.