Artigo de opinião escrito por Mayara G. Borges de Brito1, estudante do Pocket Avançado 2024
O caleidoscópio era muito conhecido nas gerações passadas como um brinquedo de criança. Trata-se de um pequeno tubo óptico formado por um cilindro com o fundo repleto de pedaços coloridos de vidro que, ao se movimentarem, combinados com a flexão de espelhos colocados no interior, dão origem a imagens coloridas e diferentes2. Esse objeto faz jus à sua origem de significado no grego, “observador de belas formas”. O ponto interessante desse brinquedo é sua capacidade de mostrar uma mesma imagem, mas com perspectivas diferentes.
A este respeito, John Frame, filósofo e teólogo estadunidense, fala sobre o complexo processo de conhecer o mundo que está posto diante de todo ser humano. Segundo o mesmo, trata-se de um constante exercício de lidar com as muitas perspectivas de si mesmo, dos outros e ainda estar preparado para deparar-se com ambiguidades (FRAME, 2023). Nesse sentido, a universidade sempre foi um espaço público frutífero para a interação das mais diversas perspectivas. Por mais que tenha experimentado décadas de uma pseudo neutralidade religiosa, ela formou e continua formando os mais diversos crentes e cientistas que vivem e trabalham para a glória de Deus.
A resposta de Frame a esse aparente grão de areia (humanidade) levado de um lado para outro por todo vento de perspectivas, é o Deus da Bíblia. O Deus que não é apenas onisciente, mas oniperspectivista3. Assim como Peter J. Leithart mostra os vestígios da Trindade nos lugares mais óbvios e ordinários da criação4, Frame oferece a seus leitores uma concepção trinitária da realidade, em três perspectivas: situacional, normativa e existencial. Nenhuma delas é percebida ou experimentada de forma separada; assim como as três Pessoas da Trindade, elas habitam concomitantemente entre si.
Estudar o curso da natureza e da história é estudar o curso do controle exercido por Deus sobre seu mundo. Seu controle fornece uma perspectiva (eu a chamaria de perspectiva situacional), que lança luz sobre tudo o que acontece. […] Estudar a autoridade de Deus é aprender sobre o universo moral, a natureza da obrigação. É estudar o mundo da perspectiva normativa. […] O Estudo da presença pessoal de Deus em todas as coisas é o que chamo de perspectiva existencial (Frame, 2023, n.p.).
Esse meio de interagir com o mundo e conhecê-lo é, consequentemente, um caminho de autoconhecimento e desenvolvimento pessoal. O “conhece-te a ti mesmo” é uma máxima da sabedoria filosófica que perpassa pela realidade da minha existência no mundo, as obrigações que tenho para com o universo e para com esse Deus pessoal que governa e tem o controle de todas as coisas. Por mais que a humanidade tenha se rebelado e sua produção científica e acadêmica tenha sido diretamente afetada por ela, o caminho de redenção e restauração é o Deus trino.
Sem admitir isso, as produções acadêmicas e científicas permanecerão em seu devaneio fragmentado. Muitas vozes isoladas em si mesmas olhando a partir de uma única perspectiva, reduzindo a realidade em teorias que não podem ser de fato experimentadas, fazendo, assim, o velho dualismo entre teoria e prática perdurar por mais algumas gerações.
Ante a isso, faz-se necessário a presença de cristãos fiéis na ágora das academias, indivíduos conscientes da interpenetração mútua do Criador consigo mesmo e com sua criação5. Mestres e aprendizes aptos a dialogar com os diversos períodos de produção de conhecimento dos últimos séculos, com os compromissos de seus corações ancorados no Deus Trino. É Ele quem nos faz enxergar, por meio das lentes do seu belo caleidoscópio, esse mundo tão complexo e belo que Ele mesmo criou.
1Aluna do Pocket Avançado 2024.
2Definição do dicionário de português Online, revisado pela lexicógrafa: Débora Ribeiro. Disponível em: https://www.dicio.com.br/caleidoscopio/
3FRAME, John M. Teologia em três dimensões – um guia para o triperspectivismo. Tradução: Susana Klassen; Editora Vida Nova, 2023
4LEITHART, Peter J. Vestígios da Trindade. Tradução: Leandro G. Faria Corcete Dutra; Editora Monergismo, 2018.
5Referência a Pericorese, termo que os teólogos, dos primeiros séculos da era cristã, utilizavam para se referir ao relacionamento eterno das Pessoas da Trindade.
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Referências bibliográficas
FRAME, John M. Teologia em três dimensões: – um guia para o triperspectivismo. Tradução: Susana Klassen. São Paulo: Vida Nova, 2023.
LEITHART, Peter J. Vestígios da Trindade. Tradução: Leandro G. Faria Corcete Dutra; Editora Monergismo, 2018.