Ensaio escrito por Rita de Cássia Peres Braga, estudante do Programa de Tutoria Filosófica 2024
Introdução
O que Deus requer de pais cristãos? A Bíblia responde extensivamente a essa pergunta. Deuteronômio 6:4-9, 20-25; Salmos 78:1-8, Juízes 1:21-24, Efésios 6:4, Colossenses 3:21 e, por toda a Escritura Sagrada, a família cristã é instada sobre sua origem, propósito e ainda é legitimada como ordenança criacional de Deus (Gn 1:26-28) (VAN GRONINGEN, 2019, p. 27). No livro Desafio aos Pais, Paul Tripp diz que Deus escolheu os pais “como instrumentos essenciais e fiéis em suas mãos para levarem seus filhos ao conhecimento de Deus (TRIPP, 2018, p. 26). Pode a família cristã exercer plenamente sua missão ignorando o entendimento acerca da sabedoria e filosofia hebraica? Podem filhos de lares cristãos terem o real conhecimento de Deus à parte de um encontro com a Sabedoria, aquela que estava com Deus na formação do mundo e que o sustenta?
A queda e a busca pela sabedoria
John Frame, na obra História da filosofia e teologia ocidental, afirma que “filosofia, em sua etimologia, significa “amor pela sabedoria” (FRAME, 2023, p. 49). A busca por conhecimento, por essa tal sabedoria, pela compreensão da realidade em que se vive, é inerente ao ser humano. Após a Queda, passou a existir no coração do homem um vazio que só a presença de Deus pode suprir. Aguardamos pelo reencontro com nosso Criador. Agostinho de Hipona, em suas Confissões, escreveu: “Fizeste-nos, Senhor, para ti, e o nosso coração anda inquieto enquanto não descansar em ti” (AGOSTINHO, 2020, n.p.). Desde então, a humanidade vem tentando encontrar sentido, razão e respostas para compreender a realidade da vida, estando afastada de seu Criador. Assim acontece na vida dos nossos filhos até que eles sejam alcançados pela graça irresistível de Jesus Cristo.
Ensinando os filhos acerca da sabedoria para a idolatria
No livro A doutrina de Deus, John Frame fala sobre a sabedoria como “um tipo de conhecimento elevado, um conhecimento que imerge no profundo significado e na relevância prática” (FRAME, 2023, p. 49). Vivemos num momento da história onde o ser humano é o ponto de partida de todas as coisas e, com a busca pela sabedoria, não poderia ser diferente. Nossos filhos estão imersos numa cultura que ensina que suas reflexões e observações devem ditar seus valores e princípios, onde o homem “é a fonte e origem da sabedoria” (LÍNDEZ, 2014, p. 60). Líndez continua afirmando que o homem proclama seu senhorio sobre todas as coisas, sendo o ponto de referência para toda a realidade, inclusive em sua relação com Deus, em sua religiosidade.
Nesse sentido, as crianças precisam crer que isso é um efeito da Queda, que faz com que os homens rejeitem o conhecimento de Deus e não o glorifiquem como Deus, substituindo a verdade de Deus pela mentira. E aqueles que assim seguem, adorando e servindo à criatura em lugar do Criador, são entregues pelo próprio Deus a uma mentalidade condenada (Romanos 1:21-22, 25, 28, A21). Os profetas Isaías e Jeremias também falam a Israel sobre a sabedoria para a idolatria.
Ensinando os filhos acerca da sabedoria para a glória de Deus — o temor do Senhor
Em Deuteronômio 6:4-9, temos o chamado de Deus para ensinarmos nossos filhos, intencionalmente e em todo o tempo, sobre as verdades do Senhor e de seu Reino. John Frame diz que a filosofia é o esforço disciplinado de articular e defender uma cosmovisão (FRAME, 2023, p. 49). Nesse sentido, é preciso defender a cosmovisão cristã no dia a dia, infundindo no imaginário dos filhos as narrativas contidas nos pilares da Criação-Queda-Redenção, inserindo-os em nossas conversas e momentos ordinários diários. Eles precisam ter urgentemente a certeza de quem são, de onde estão, o que há de errado com a realidade e qual a solução para o grande problema da humanidade — sua separação de Deus (WALSH, MIDDLETON, 2010, p. 32). Não há como criar os filhos na disciplina e instrução do Senhor (Ef 6:4) sem os firmar na cosmovisão cristã. O homem não encontrará a tão almejada sabedoria em seu estado de rebelião ao Criador, nem os filhos que ainda se encontram desta forma. Precisamos mostrar a eles que se tornarão escravos nessa busca e que longe de Deus nunca encontrará seu fim.
A revelação da verdadeira sabedoria vem progressivamente nas Escrituras. Desde o Êxodo, até encontrar seu clímax em Jesus, vemos que a sabedoria nos é dada por meio de diversas expressões pelo próprio Deus. Aleluia! Ela está no temor do Senhor. Provérbios 9:10 diz que “O temor do Senhor é o princípio da sabedoria; e o conhecimento do Santo é o entendimento”. Ela está em nossa relação de conhecimento, temor e confiança no verdadeiro Deus vivo, o Senhor da Aliança, pois o temor do Senhor “significa amá-lo com tudo o que você é e confiar nele com tudo o que você possui” (ROBERTSON, apud, DULCI, 2024, n.p.).
É sobre isso que os filhos precisam ser ensinados. A sabedoria hebraica é teotrópica, sendo Deus seu ponto de partida, o arché, e para onde tudo se orienta. Igor Miguel diz que “as ações do sábio são compatíveis com a ordem de Deus (…) A sabedoria bíblica é epistemologicamente “criacional” e “relacional”, o que a conecta com a narrativa hebraica de um mundo criado por Deus” (MIGUEL, 2021, p. 121,122). A sabedoria hebraica responde em obediência às leis que o próprio Deus dá à realidade. Em contraste com a sabedoria grega, onde a sabedoria tinha em vista a polis, a sabedoria bíblica é para o oikos. Nesta, o ambiente familiar, o lar, funciona como o potencial lugar para a transmissão da sabedoria que é teorreferente.
Conclusão
Portanto, conclui-se que é urgente que os pais concentrem seus esforços no ensino intencional de seus filhos a respeito de onde encontrar a verdadeira sabedoria, porque sem esta eles estarão reféns de filosofias e ideias idólatras. Devemos cumprir nosso chamado divino como pais tementes ao Senhor de proporcionar a eles uma vida recheada e transbordante do Evangelho, que os levará ao encontro com a Sabedoria, na pessoa do Salvador Jesus, pois, no final, existem apenas dois lugares onde se possa buscar o entendimento: em Deus, ou fora de Deus. Em Deus poderão viver de forma verdadeiramente sábia, orientados na realidade e glorificar a Deus em tudo o que fizerem. Fora de Deus, serão escravos de relativismos, humanismos e de qualquer outro reducionismo que os aprisione numa realidade relativa, e não a absoluta criada pelo Senhor. Que eles compreendam que “Ser sábio é reconhecer nossa natureza como criação e Deus como o único Criador. A sabedoria não é inata, mas um presente de Deus as suas criaturas” (BARTHOLOMEW apud DULCI, 2024, n.p.). Assim, que possam viver desfrutando da presença da Sabedoria e honrando a Deus por todos os seus dias.
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Referências Bibliográficas
AGOSTINHO. Confissões. Vol. 1. Tradução de Frederico Ozanam. Rio de Janeiro: Petra, 2020. 496 p.
BÍBLIA SAGRADA. Almeida Século 21. São Paulo, SP. Purpose Paper Serviços de Papelaria. 2023. 1760 p.
DULCI, Pedro. O período intertestamentário e o verdadeiro pano de fundo para a formação da sabedoria do Novo Testamento. Invisible College. Goiânia-GO. 2024. Duração 38:59. Disponível em https://hubinvisiblecollege.com.br/course/tutoria-filosofica-2024.
DULCI, Pedro. O que é a sabedoria e quem eram os sábios em Israel: algumas definições prévias. Invisible College. Goiânia-GO. 2024. Duração 26:32. Disponível em https://hubinvisiblecollege.com.br/course/tutoria-filosofica-2024.
FRAME, John M. História da filosofia e teologia ocidental. Tradução de Pedro H. R. De O. Issa. 1 ed. São Paulo, SP. Editora Vida Nova. 2023. 1184 p.
LÍNDEZ, José Vílchez. Sabedoria e sábios em Israel. Tradução: José Benedito Alves. 3 ed. São Paulo, SP. Edições Loyola Jesuítas. 2014. 268 p.
MIGUEL, Igor. A escola do Messias: fundamentos bíblico-canônicos para a vida intelectual cristã. 1 ed. Rio de Janeiro, RJ. Editora Thomas Nelson Brasil. 2021. 208 p.
TRIPP, Paul. Desafio aos pais. Tradução: Cláudia Vassão Ruggiero. 1 ed. São Paulo, SP. Editora Cultura Cristã. 2018. 176 p.
VAN GRONINGEN, Harriet e Gerard. Al. A família da aliança: Instruções bíblicas para a vida familiar que honra a Deus. Tradução: Bethania Fonseca da Silva; Maria Priscila Barros. 3 ed. São Paulo, SP. Editora Cultura Cristã. 2019. 160 p.
WALSH, Brian J. e MIDDLETON, J. Richard. A visão transformadora. Tradução Valdeci Santos. 1 ed. São Paulo, SP. Editora Cultura Cristã. 2010. 192 p