Resenha escrito por Rodrigo Dias, estudante do Programa de Tutoria Filosófica 2023
EDWARDS, Jonathan. Jonathan Edwards, uma antologia: escritos públicos e pessoais. Editado por John E. Smith, Harry S. Stout, Kenneth P. Minkema. Tradução de Márcio Loureiro Redondo. São Paulo, SP: Vida Nova, 2022. 384 p.
O presente livro é uma coletânea, selecionada cuidadosamente, dos tratados, sermões e escritos autobiográficos do maior teólogo e filósofo dos primórdios dos Estados Unidos da América, Jonathan Edwards (1703 – 1758). A antologia tem como editores, John E. Smth1, Harry S. Stout2 e Kenneth P. Minkena3, buscando fornecer uma visão abrangente das principais ideias e ensinamentos de Edwards. Apresenta uma variedade de tópicos teológicos, filosóficos e práticos da vida espiritual, sendo considerada a melhor introdução ao pensamento complexo e profundo dele.
Sem dúvida, antes de falar do livro, é preciso falar do autor, Jonathan Edwards. Resumidamente, ele foi um teólogo, pregador e filósofo norte-americano, nascido em East Windsor, Connecticut, em 5 de outubro de 1703. Filho do reverendo Timothy Edwards e de Esther Stoddard Edwards, filha do também reverendo Solomon Stoddard, o influente “papa” de Northampton, Massachusetts. Assim, sua criação foi extremamente religiosa (p. 10).
Edwards foi um jovem precoce, ingressando na Yale College em 1716, “já tendo uma mente inquiridora, que não conhecia limites, quer científicos, quer literários. Somado à sua mente prodigiosa havia um desejo ardente de ser amplamente reconhecido como ‘instrumento’ na causa de seu Cristo” (p. 11). Em 1726, foi chamado para ser pastor de uma Igreja em Northampton, Massachusetts, onde se tornou amplamente conhecido por seus sermões. Nessa mesma igreja, Edwards encontrou oposição na comunidade de Northampton devido a algumas de suas visões teológicas e práticas pastorais. Sendo demitido em 1750, foi trabalhar como missionário entre os indígenas mohawks. Em janeiro de 1758, assumiu a presidência da College of New Jersey4, localizada na região de Princeton. O local estava enfrentando uma epidemia de varíola, e, como precaução, Edwards, o “eterno estudante da nova ciência, concordou em ser inoculado. Infelizmente, o soro estava infectado e Edwards morreu em 22 de março” (p. 37). Jonathan Edwards foi casado com Sarah Pierpont Edwards e teve uma família grande, com treze filhos. Perry Muller, autor da clássica biografia Jonathan Edwards (1949),
comparou Edwards a um Milton americano: a teologia era o meio de expressão de Edwards tão certo quanto o verso branco era o meio de Milton. No mesmo estilo grandiloquente, mas tendo outro exemplo em mente, H. Richard Niebuhr apelidou Edwards de ‘Agostinho americano’. Ambos estavam corretos. À semelhança de Milton, Edwards buscou na religião de língua inglesa uma renovação que fizesse justiça à Reforma, a qual o alemão Martinho Lutero e seus herdeiros protestantes haviam provocado. E, tal como Agostinho procurou conciliar a piedade com as formas mais elevadas de conhecimento secular no mundo latino da lógica e da retórica, Edwards procurou conciliar a piedade com a nova era científica e filosófica iniciada por Newton e Locke. Contudo, nem, o termo ‘artista’, nem o termo ‘teólogo’, quando entendidos isoladamente, conseguem captar a medida plena do homem; é apenas na interseção dos dois que podemos começar a entender o alcance das realizações de Edwards (p. 7-8).
Por certo, um livro que se propõe a apresentar uma antologia de Edwards precisa conter seus escritos mais importantes e demonstrar o pensamento do autor. Jonathan Edwards, uma antologia inicia com a famosa Carta sobre a aranha, escrita em 1723. Aqui, é possível ver Edwards, ainda jovem, observar o comportamento de uma aranha voadora. Ele parece seguir uma linha bastante empírica, mas toda sua observação possui um lado metafísico, “vislumbrando no misterioso equipamento que permite à aranha voar uma lição ilustrada da sabedoria do Criador” (p. 11). Em temas da Miscelânea, vemos os diversos interesses filosóficos de Edwards. Nos tratados Sobre o Ser e A mente, é possível vislumbrar o lado filósofo do autor, apresentando brilhantes argumentos:
À semelhança do grande filósofo irlandês George Berkeley, Edwards aqui define espírito como a verdadeira substância e a existência como uma emanação divina da mente de Deus. Mas, ao contrário de Berkeley, Edwards resiste a uma dúvida completa sobre o “mundo externo”, insistindo em que “as coisas estão onde parecem estar”. No outro extremo, em oposição a Descartes, Hobbes e outros que postulavam a existência autônoma e separada da matéria, ele insistia na primazia da consciência de Deus que sustenta tudo. Edwards tinha um senso tão vasto da soberania divina que, para ele, se a consciência de Deus cessasse mesmo por um instante, o próprio universo deixaria de existir. Mediando, dessa maneira, entre Berkeley, de um lado, e Locke, Descartes e Hobbes, do outro, o jovem Edwards esperava resgatar o cristianismo do peso opressor do racionalismo e da inércia paralisante do ceticismo (p. 12).
Além disso, muitos outros escritos demonstram a profunda preocupação com a realidade do pecado, como Pecadores nas mãos de um Deus irado. Edwards trata da questão do pecado como um importante contraponto aos excessos otimistas da humanidade. No texto sobre a Beleza do mundo, há o outro lado, mostrando sua preocupação com a beleza, a excelência e a bondade da criação.
Outrossim, o livro contém outros diversos escritos de Edwards, como o que o levou a fama internacional, Uma narrativa fiel da surpreendente obra de Deus e a análise do famoso Grande Despertamento, em Afeições religiosas. Há também o ataque ao arminianismo, em especial à autonomia da vontade, em no Liberdade da vontade e, por fim, a defesa da doutrina do Pecado original, além de diversas cartas e escritos pessoais.
Em suma, nesse exíguo espaço é difícil abordar uma antologia do maior teólogo e filósofo dos primórdios dos Estados Unidos da América. Porém, a leitura do livro mostra Jonathan Edwards como um filósofo, teólogo, pregador e psicólogo, “sempre examinando a própria alma e a dos outros em busca das mesmas pistas espirituais que buscava na ciência e na filosofia” (p. 33). É possível ver como seu pensamento é amplo e multifacetado, incorporando aspectos da teologia, da filosofia e da psicologia, mas sempre tendo como ponto de partida a revelação de Deus.
Não obstante, o maior problema em Edwards é falta do seu posicionamento em relação à escravidão ficando nítido em seus escritos. Da mesma forma, ele era um homem do seu tempo, tirá-lo de seu contexto pode gerar incompreensões ao seu pensamento. Por fim, a maior contribuição de Jonathan Edwards, visível no livro, é que é possível produzir escritos teológicos, filosóficos e psicológicos tendo como ponto de partida as Escrituras Sagradas.
1 John E. Smith foi professor emérito da Yale University e editor da série The works of Jonathan Edwards até sua aposentadoria em 1991.
2 Harry S. Stout é professor “Jonathan Edwards” de história religiosa americana na Yale University e atual editor da série The works of Jonathan Edwards.
3 Kenneth P. Minkena é o editor executivo da Jonathan Edwards Center e pesquisador da Yale Divinity School.
4 Atualmente conhecida como Princeton University.