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Resenha do livro Teologia Bíblica: Antigo e Novo Testamentos

Resenha escrita por Fernanda Cerqueira Campos Lunaestudante do Programa de Tutoria 2020 – Turma Essencial


VOS, Geerhardus. Teologia Bíblica: Antigo e Novo Testamentos. Trad. Alberto Almeida de Paula. 2ª ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2019.


A obra Teologia Bíblica foi escrita pelo professor Geerhardus Vos e publicada nos Estados Unidos em 1948, tendo sido traduzida para o português no ano de 2010. Nas duas primeiras partes ela trata sobre o Antigo Testamento, sendo a primeira parte subdividida em oito capítulos sobre o período mosaico de revelação e uma segunda parte, subdividida em seis capítulos, na qual é exposto o período profético de revelação. Em um terceiro momento versa sobre o Novo Testamento, o qual, todavia, não será objeto de análise nesse momento.

Na primeira parte do livro, o autor expõe sobre o período mosaico de revelação, percorrendo as Escrituras desde o Gênesis até os acontecimentos ocorridos nos tempos de Moisés. O processo revelacional caracteriza-se por ser historicamente progressivo, por ter sido incorporado na História, por ter uma natureza orgânica e por sua adaptabilidade prática (2019, p. 16-20), bem como por ter os seguintes princípios orientadores: infalibilidade, objetividade e ser de caráter inspirativo (2019, p. 23-26).

Geerhardus ensina que a revelação pode ser diferenciada entre revelação geral (também chamada de natural, que vem a todos uma vez que procede da natureza) e revelação especial (que é a sobrenatural e recai a um círculo limitado, pois decorre da autorrevelação de Deus). Aquela existia antes e fora do pecado e esta existe de forma modificada sob o regime do pecado (2019, p. 33). E a revelação especial subdivide-se em pré-redentora (“pacto das obras”) – que compreende Gênesis, capítulos 1 e 2, e redentora (“pacto da graça”) – que se estende de Gênesis, capítulo 3 até o capítulo 22 de Apocalipse. Assim é que, grande parte do Antigo Testamento versa sobre o “pacto da graça”, especialmente sobre o momento que precede a vinda do Messias, enquanto que no Novo Testamento encontramos o “pacto da graça” desde a aparição do Messias até os dias de hoje (2019, p. 38).

O autor esclarece ainda que, o período da revelação especial pré-redentora (Gênesis 1 e 2) caracteriza-se por uma grande utilização de signos, ou seja, tudo é altamente simbólico, todavia, um simbolismo real incorporado nas coisas reais (2019, p. 43), sendo quatro os princípios contidos nessa revelação: princípio da vida, princípio do teste ou provação, ambos simbolizados pela árvore da vida, princípio da tentação e pecado, simbolizado na serpente e princípio da morte, refletido na dissolução do corpo. Adão e Eva, os quais servem de paradigma para cada um de nós, ao comerem do fruto da árvore do bem e do mal, quebraram o “pacto das obras” (no qual estava inserta a eternidade, caso não comessem), pois diante de uma provação cederam ao tentador, o que lhes gerou por consequência a morte.

Geerhardus Vos expõe adiante que três maldições foram proferidas, respectivamente, à serpente, à mulher e ao homem (Gn 3.14-19), sendo que “na maldição da serpente reside uma promessa de vitória sobre ela e sua semente” (2019, p. 60), bem como a presença de elementos da graça (iniciativa divina na obra de libertação, essência do ato de libertação consistente no reverso da atitude assumida pela homem em relação à serpente e a Deus e a continuidade da obra de libertação é declarada). Já vislumbramos aqui o agir de Deus com requintes de graça, no sentido de preservar Seu povo. Em razão de o homem ter quebrado o “pacto das obras”, uma nova aliança foi necessária, qual seja, o “pacto da graça” (o envio do Filho de Deus para que, por meio de suas obras encontrássemos salvação, fé e esperança).

No que diz respeito à revelação noaica e o desenvolvimento que conduz a ela, o autor elucida que no período de Noé a humanidade praticou uma iniquidade excessiva, de modo que “o desenvolvimento da humanidade fracassou quanto à finalidade para a qual Deus havia posto o homem na terra” (2019, p. 72). Mas, mesmo com o dilúvio, a família de Noé (o suficiente de entre os destroços) foi salva para que a raça humana pudesse ser preservada. Na revelação após o dilúvio, Deus reafirmou o propósito de instituir uma nova ordem de coisas (Sua aliança em não mais destruir a terra por causa do homem), descreveu medidas para dar conteúdo a essa nova ordem (propagação e proteção da vida) e relatou a confirmação na forma de uma aliança (simbolizada pelo arco-íris).

A torre de Babel (Gn 11.1-9), criada com o objetivo de que existisse um centro de unidade para manter a raça humana unida, sofreu a influência de Deus (que espalhou o povo sobre toda a terra e confundiu a sua língua) justamente “em função da fidelidade à sua promessa de que o desenvolvimento pecaminoso da humanidade não vai resultar, mais uma vez, numa catástrofe da mesma escala de proporção do dilúvio” (2019, p. 81).

No que tange à revelação no período patriarcal, Geerhardus escreve que os patriarcas são atores reais no drama da redenção, o começo do povo de Deus (2019, p. 90-92) e que a forma e o conteúdo revelacional desse período ocorrem por meio de teofanias, do anjo de Yahweh, que se manifesta para se aproximar do Seu povo (intento sacramental), mas também para redimir esse povo (intento espiritualizante). O autor apresenta elementos e princípios comuns na vida dos patriarcas Abraão, Isaque e Jacó, quais sejam, o princípio da eleição (Deus dá prosseguimento ao seu trabalho revelatório por meio da escolha), a objetividade dos dons outorgados pela revelação (Deus concede promessas aos patriarcas) e o monergismo absoluto do poder divino em cumprir as coisas prometidas de forma sobrenatural. Ao lado dos princípios, encontramos também elementos éticos na revelação patriarcal (hospitalidade, generosidade, autossacrifício e lealdade) (2019, p. 114-118) e, sobretudo, a questão da fé, que tem em Abraão o seu principal expoente (Gn 22.2, 16-18).

E no período mosaico, em si mesmo, Geerhardus Vos pondera que Moisés teve um papel relevante no desenvolvimento da religião do Antigo Testamento, seja por sua louvável liderança política, seja pelo surgimento do plano moral de vida para que um Deus melhor pudesse emergir dele. Embora não lhe tivesse sido permitido ver a “face” de Deus, foi honrado com o acesso direto e contínuo a Yahweh e o reflexo da glória divina na sua face depois de quarenta dias e quarenta noites com Deus no topo da montanha (Ex 32.29 s.) (2019, p. 135), tendo esse período quatro formas de revelação: a coluna de fogo e a nuvem, o anjo de Yahweh e a face de Yahweh (todas elas expressam a permanência da presença divina). O conteúdo decorrente da revelação no período mosaico trouxe maior proximidade e segurança com as promessas de Deus para o povo da aliança.

Finalmente, na segunda parte do livro, o autor expõe sobre o período profético de revelação, que se inicia nos dias de Samuel, passa pelo reinado de Saul, até a ascensão de Davi. O reino humano “é somente uma representação do reino do próprio Yahweh” (2019, p. 227), sendo que por meio do reinado de Cristo, atinge-se o apogeu e perfeição da religião bíblica. O instrumento utilizado pelos profetas era a palavra, Deus se dava a si mesmo na palavra da boca deles. O trabalho do profeta está na esfera da fala. Eles eram levantados como guardiões da pureza da teocracia, ou seja, eles levavam aos ouvidos dos reis mensagens no sentido de que eles eram tão somente meras representações de um reino cósmico muito maior que eles. Portanto, os profetas falavam de algo que tinha referência na história presente, mas que também tinha implicações futuras.

A utilização dessa obra, como instrumento de estudo do Antigo Testamento, consiste em uma excelente escolha por parte do cristão, na medida em que, por meio do primoroso ensinamento do Geerhardus Vos, ao leitor será permitido compreender, especialmente, como que Deus, desde os tempos de Adão e Eva (por meio do “pacto das obras”), seguindo pelos períodos de Noé, dos patriarcas, de Moisés, dos profetas e até os dias de hoje (por meio do “pacto da graça”), sempre apresentou o projeto revelacional que tinha para o Seu povo. Os registros inseridos no Antigo Testamento apontam para o Messias que haveria de vir, contudo, não deixam dúvidas de que já havia o derramar da graça sobre o povo de Deus, antes mesmo da vinda do Filho de Deus, mesmo que tenha sido minimamente, como ocorreu nos tempos de Noé, seja quando Ele se manifestou ao Seu povo por meio de grandes homens como Moisés, os patriarcas ou os profetas.