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Vencendo a glória própria

Entendeis o que eu fiz? Vós me chamais de Mestre e Senhor e dizeis bem, pois eu o sou. Ora, se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os pés, vós deveis também lavar os pés uns dos outros. Eu vos dei o exemplo, para que façais o que eu fiz

João 13:12b-15

Talvez tenhamos nos tornado confortáveis demais. Talvez tenhamos deixado de examinar a nós mesmos e à cultura que circunda aqueles de nós que foram chamados para o ministério nas igrejas locais.

Paul David Tripp

Dizem que um dos livros mais difíceis que C. S. Lewis escreveu foi o Cartas de um diabo a seu aprendiz. Não foi nada fácil se colocar “do outro lado”, aquilo lhe demandou grande esforço. De forma similar, o pastor e conferencista Paul Tripp também se viu diante de um desafio ao escrever Vocação perigosa: os tremendos desafios do ministério pastoral. Ele não precisou se colocar “do outro lado”, como o fez Lewis, mas teve de lidar com “o lado de cá”, a pecaminosidade do seu próprio coração.

Se dirigindo especialmente a cada pastor e seminarista, seus companheiros de ministério, Paul Tripp definiu Vocação perigosa como um livro diagnóstico. Seu objetivo foi tratar dos problemas de uma cultura que tem comprometido a fé e o bem-estar de muitos ministros da Palavra numa sociedade do cansaço. Ele coloca sobre a mesa “as tentações que são singulares ao ministério pastoral ou intensificadas por ele” (2014, p. 9). Uma leitura imprescindível a todo aquele que aspira cuidar do rebanho de Cristo.

Para Paul Tripp, é importante compreender que o ministério pastoral é, sobretudo, conduzido por uma vida de adoração. A questão é quem de fato adoramos: “O seu ministério será moldado pela adoração a Deus, adoração a si mesmo ou, para a maioria de nós, uma mistura perturbadora de ambas” (2014, p. 145). E nesta mistura reside um dos grandes perigos que rondam a vida de um ministro, a glória própria:

Talvez no ministério não haja um intoxicante mais potente do que o louvor dos homens, e não há forma mais perigosa de embriaguez do que estar embriagado com a sua própria glória. Ela tem o poder de reduzi-lo à justiça própria chocante e à inacessibilidade. Ela fará de você alguém com quem é difícil trabalhar e será quase impossível para as pessoas mais próximas a você ajudá-lo a ver que você se tornou difícil. Ela fará com que você considere com desprezo as pessoas que são parecidas do que diferentes de você. Ela o levará a se cercar de pessoas que, frequentemente, dizem sim e, frequentemente estão prontas a concordar. Ela o deixará espiritualmente insensato e moralmente desprotegido. E tudo isso acontecerá sem que você note porque você permanecerá convencido de que está perfeitamente bem. Quando confrontado, você se lembrará da sua glória. Quando questionado, defenderá sua glória. Você negará sua cumplicidade em problemas e sua participação em fracassos. Você terá muito mais habilidade em atribuir culpa do que em participar da culpa. Você será melhor em controlar do que em servir. Você resistirá ao trabalho que pensa ser abaixo do seu nível e se ofenderá com aqueles que se atrevem a dizer a você o que fazer. Você constantemente confundirá ser um embaixador com ser um rei (2014, p. 145).

O relacionamento de Jesus com seus discípulos é um bom exemplo de como vencer a glória própria. A passagem de João 13, quando o Senhor está para ceiar com os doze, demonstra “o tipo de humildade que, pela graça, deve fascinar o coração de todo pastor e formar o estilo de vida do seu ministério” (2014, p. 148). O gesto do Senhor de lavar os pés dos discípulos foi um momento inesquecível na vida daqueles homens.

Qual é a lição grandiosa, a vocação majestosa deste momento surpreendente? Aqui está: Jesus diz: “Se vocês não são maiores do que o seu mestre e ele está pronto a fazer essa coisa repulsiva, vocês também devem estar prontos. Se vocês forem meus embaixadores, chamados para representar a minha vontade e o meu caminho, chamados para ser instrumentos da minha graça redentora, então vocês não devem pensar que qualquer tarefa ministerial está abaixo de vocês. Vocês devem estar dispostos a fazer a coisa mais baixa, mais aviltante, de tal maneira que a minha obra e a minha vontade sejam feitas. Vocês não devem recusar. Vocês não devem pensar que são bons demais. Vocês devem estar dispostos a serem os mais inferiores dos escravos para que o meu reino possa vir e a minha vontade possa ser realizada. Vocês devem estar dispostos a fazer qualquer coisa que seja necessária para se colocarem na posição de instrumentos de graça redentora. Vocês não devem ser orgulhosos. Vocês não devem ser relutantes” (2014, p. 150).

Nossa pecaminosidade nos inclina a pensar acerca de nós mesmos mais do que do que deveríamos, diz Tripp. Sofremos de uma “amnésia de identidade” todas as vezes que julgamos algum serviço no reino como inferior a nós (2014, p. 151), e por isso também precisamos ficar vigilantes. Mas não é necessário ter medo. O Senhor está ao alcance daqueles que tem sido levados pelo orgulho no seu ministério. “Você pode correr para ele e admitir a glória própria constrangedora e saber que ele não o ridiculizará nem o recusará, porque sua permanência diante dele não está baseada no seu desempenho, mas no desempenho do seu Filho” (2014, p. 151).


REFERÊNCIAS

TRIPP, Paul. Vocação perigosa: os tremendos desafios do ministério pastoral. Trad. Meire Portes Santos. São Paulo: Cultura Cristã, 2014.