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Resenha: Um método trinitário neocalvinista de apologética — reconciliando a apologética de Van Til com a filosofia reformacional

Escrita por Júnia Lacerda de Castro Bretas, estudante do Programa de Tutoria Avançada 2023


BRAUN JUNIOR, Guilherme. Um método trinitário neocalvinista de apologética: reconciliando a apologética de Van Til com a filosofia reformacional. Tradução de Marcelo Lemos. 1ª ed. Brasília, DF: Academia Monergista. 275 p.


A obra Um método trinitário neocalvinista de apologética é um minucioso estudo elaborado pelo teólogo e pesquisador Guilherme Braun Junior, um brasileiro que vive na Alemanha e fez pós-doutorado em Ciências da Religião e Missiologia, na África do Sul.  Esta edição tem dois sumários, sete capítulos e bibliografia. Apresenta um acalorado debate apologético entre nomes destacáveis da teologia reformada e da filosofia reformacional, como Cornelius Van Til, Herman Dooyeweerd e Hendrik Stoker, mediados por Braun Junior. O leitor é presenteado com uma variedade de citações desses estudiosos, além de ser apresentado ao novo método trinitário apologético, um reforço para o reflorescimento da igreja reformada à luz da Palavra de Deus.

Na introdução, o autor compartilha a importância de relacionar as semelhanças e diferenças entre Van Til e Dooyeweerd apresentadas no Festschrift de Van Til. Para isso, o autor aguça a curiosidade do leitor com vários questionamentos do gênero: “Como pode o método apologético de Van Til ser combinado com a filosofia reformacional?” (p. 23). Entre Dooyeweerd e Van Til, não havia conciliação em termos, apologéticos, filosóficos e teológicos, ainda que o método transcendental do primeiro tenha inspirado o segundo, no intuito de reformar a apologética. No entanto, a abordagem transcendente de Van til apresenta uma crítica às outras ciências, partindo da teologia. Ele ainda não inclui em sua ontologia o “insight central da filosofia reformacional sobre o significado bíblico do coração” (p. 26). Portanto, é inegável a contribuição desses estudiosos para a reforma da apologética, cujo método procura uma ontologia não reducionista e trata acertadamente da Criação de Deus. 

No começo do segundo capítulo, o autor discute as ideias de Dooyeweerd sobre Van Til, que não diferencia crítica teórica de suprateórica em suas exposições, especialmente ao abordar questões filosóficas. Tal distinção faz toda a diferença para “ver que o ego transcende o tempo e funciona como ponto de referência central da consciência na inclinação a Deus” (p. 39), pois, na visão de Van Til, o ponto de partida é o conhecimento teórico sobre a realidade, encerrando em reducionismos. Dooyeweerd também examina o fato de Van Til afiançar a existência de uma “metafisica cristã”, oriunda das Escrituras. Segundo ele, a filosofia calvinista não dispõe de metafísica por ser especulativa. Portanto, esse trabalho crítico e intelectual é de real importância para o apologeta, por proteger a filosofia e a teologia dos motivos não bíblicos e, ainda, serve como ponto de contato com o não cristão.

Posteriormente, Braun Junior discorre sobre as respostas de Van Til a Dooyeweerd, que não considera o diálogo com o homem que não está em pacto com Deus. Para Van Til, o cristão possui pressupostos corretos e pode construir uma “metafisica cristã” a partir da racionalidade. Todavia, Dooyeweerd não apoia tal proposta, pois tende a edificar uma teologia e filosofia dogmáticas e, ainda, deprecia a sua oposição à graça comum. No entanto, o autor vê um avanço para a apologética, quando Van Til avalia a crítica transcendental de Dooyeweerd, pois “trata intrinsecamente os limites da filosofia ao abordar o homem natural” (p. 56). Logo após, Hendrik Stoker é apresentado, de modo a aproximar Van Til de Dooyeweerd. Para isso, apoia o primeiro por priorizar a fé religiosa em relação ao conhecimento teórico e ao segundo, quando sugere que o apologeta deve apoiar a ontologia não reducionista e entender a integralidade da Palavra-Revelação. Como suplemento à teoria de Van Til, Stoker propõe uma ideia filosófica neocalvinista com base na revelação da criação.      

Contudo, depois dos acirrados debates, Braun Junior adiciona as contribuições de Jeremy Ive, que, influenciado por Van Til, alega que somente por meio da Trindade — a raiz transcendente da filosofia reformacional — é possível entender a unidade e diversidade do mundo. Inclusive, o ponto de partida do apologeta deverá ser dessa doutrina, pois esclarece a experiência temporal e o ser de Deus — a Origem absoluta. Isso converge para uma apologética reformacional, “pois sua tarefa envolve não apenas a diversidade radical e a coerência das esferas modais da realidade criada” (p. 96), mas, fundamentalmente, o surgimento de possibilidades para pregação do Evangelho de Jesus Cristo. A seguir, o autor mostra as relações centrais do ego, com a diversidade modal temporal, os outros e Deus, a única possibilidade de uma direção concêntrica. Aclarar essas relações é importante para a apologética desde que seja interpretado pelo cristão “como o encontro entre duas criaturas feitas à imagem de Deus e que compartilham o mesmo horizonte existencial da experiência dependente do Deus Triúno” (p. 110). 

Braun Junior faz uma pausa no capítulo quatro para apresentar conclusões prévias do trabalho feito até aqui. Em concordância com pregar o evangelho a toda criatura (Mateus 16:15), o método trinitário neocalvinista de apologética é uma ferramenta importante no confronto com incrédulos, pois une a teologia reformada — crítica transcendente — à filosofia reformacional — crítica transcendental —, revelando a obra do Deus Triúno com a sua igreja. 

Com o intuito de comparar e interagir o método trinitário apologético com outras tradições cristãs, o autor escreve sobre o jesuíta e apologista Marlet. Ele promove uma interação com Dooyeweerd ao concordar a respeito do motivo básico bíblico, decorrente da ontologia participativa apresentada pelo tomismo da Nova Teologia Católica. Para Marlet, a junção entre a filosofia cristã e a Nova Teologia encontraria seu ponto de partida na crença “de que o pensamento filosófico é envolvido por um a priori teológico no sentido de uma revelação a priori sobre a realidade da encarnação e testificando que todas as coisas subsistem em Cristo” (Cl 1:17) (p. 190).

Portanto, essa aproximação é benéfica por ampliar o cristianismo e afastá-lo do escolasticismo e, ainda, complementar o método apologético neocalvinista. A seguir, o autor expõe a Ortodoxia Radical, movimento guiado por Henri de Lubac, que rejeita a autonomia do cosmo e excede a visão dualista de natureza e graça. Abraçando a Nova Teologia, a Ortodoxia Radical é fiel à revelação bíblica, tanto na teologia como na filosofia.

A possibilidade de integrar o método apologético neocalvinista com outras perspectivas são exploradas por Ravi Zacharias, um exemplo exibido por Braun Junior no sexto capítulo, de como o neocalvinismo apresentado nessa metodologia pode executar a função transformacional. No último capítulo, o autor conclui que, apesar das divergências entre esses notáveis senhores, dons e abordagens foram compartilhados e o método trinitário neocalvinista de apologética é um caminho seguro para o futuro da apologética reformada.

Ao finalizar essa laboriosa leitura, é necessário expressar gratidão a Deus por capacitar esses estudiosos e servos, os quais usaram sua inteligência em benefício do Reino do Senhor. É recompensador conhecer o método trinitário que conduz o incrédulo ao encontro com o único e verdadeiro Deus!