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Reflexões sobre O Dilema das Redes

Quando a Bruna, minha esposa, disse que assistiu ao documentário “The Social Dilemma” e me recomendou que também o fizesse, eu disse que “provavelmente nada do que fosse falado lá a gente já não soubesse.” Arrogância minha? Desculpem! Não era pra ser.

O fato é que alguns dias depois eu assisti, mas realmente estava certo. Para quem trabalha com e/ou estuda sobre mídias sociais, boa parte – para não dizer tudo – do que foi dito no documentário não era novidade. Sinceramente, não me assustei nem um pouco.

Me assustei mais ao ver amigos e pessoas que eu conhecia chocadas com o documentário (cheguei até a perguntar sobre isso nos stories), do que com o próprio documentário em si.

Por esse lado, o documentário é muito positivo! Pois, estando disponível em uma plataforma de streaming que várias pessoas tem acesso, é uma forma de levar informação sobre esse “lado oculto” das redes para quem habitualmente não se preocupa com isso.

Parte 01 – As redes e o seu uso

Não, a tecnologia não é neutra! Ter consciência disso é o primeiro passo. Existem questões políticas, sociais e, principalmente, econômicas por trás de tudo. Não sejamos ingênuos!

Nos últimos dias, publicamos um estudo aqui no Invisible College sobre Competências Pro Futuro. Duas dessas competências são: Capacidade Crítica (ser crítico na leitura do mundo e das informações) e Capacidade Tecnológica (compreender e fazer o uso adequado das tecnologias que estão presentes na nossa vida). Coincidência?

Não sou contra as redes. Não sou contra usá-las. As redes podem ser usadas tanto para derrubar governos ditatoriais (lembram da Primavera Árabe, 10 anos atrás?), quanto para eleger governos questionáveis (Brasil? EUA?). Acho que é a combinação desses dois elementos – a capacidade crítica e a capacidade tecnológica – que são fundamentais para o bom uso delas.

Quantos minutos por dia? Quais redes? Qual a melhor maneira? Bem.. isso depende da realidade de cada um, dos limites de cada um. Eu, por exemplo, uso Twitter e Instagram. Mas ambas com as notificações desativadas. Esse pode ser um bom começo!

Parte 02 – A questão dos dados

Fazendo um comentário à parte, algo que achei bem irônico foi esse documentário ser publicado justamente na Netflix, que pratica algumas das questões apresentadas e criticadas nele.

As recomendações da plataforma são com base em algoritmos (semelhante ao YouTube). As produções originais – sem querer tirar o mérito dos roteiristas – com certeza também são baseadas em uma análise de dados dos usuários, que indicam preferências e tendências, atendendo à demanda. Ou então, por que você acha que o tempo de ir para o episódio seguinte agora é de apenas 5 segundos? Ou melhor, porque os episódios passam para o próximo automaticamente? Comodidade? Tire um tempo para ler sobre “economia da atenção”.

Já que o assunto é uso de dados, veja o que Bernard Marr, um autor best-seller, diz sobre essa questão:

“No nível mais básico, os funcionários na maioria das funções deverão acessar os dados e determinar como agir com base neles. (…) Em um nível mais fundamental, todos precisam ser capazes de entender o impacto potencial das novas tecnologias em seus setores, negócios e trabalho.”

Data Economy (ou Economia de Dados) é uma megatendência mapeada por diversos autores. Sobre isso, a autora Martha Gabriel diz que:

“Na era digital, as formas de produção e valor passam a depender de dados: aqueles (indivíduos, empresas e países) que dominam os dados, passam a dominar o mundo.”

Se estamos conectados, estamos gerando dados. Isso é uma realidade, e diante disso há algumas implicações: o quanto há de restrições legais na sua coleta, armazenamento e uso, e o quanto estamos conscientes do valor desses dados que geramos.

Um relatório recente da LSN:Global mostra que há uma crescente conscientização do público em relação ao uso de dados pelas marcas. Segundo o relatório, há um crescente “(…) desejo dos consumidores de controlar seus dados e ditarem como, quando e onde serão usados.”

Sem querer ser pessimista, e dizendo por mero achismo, não acredito que isso será algo tãaao rápido de acontecer. Mas uma hora vai! É uma questão que tem impactos nos âmbitos político, social, cultural, econômico.. não tem como ignorá-la.

Parte 03 – A responsabilidade pessoal

Uma questão que me gerou um pouco de incômodo no documentário foi colocar toda a culpa apenas nas redes sociais e nas pessoas que as desenvolvem. Claro que essa é a “linha editorial” dele. Ele quis justamente expor essas questões, tanto que a maioria dos entrevistados são ex-funcionários dessas empresas.

Também é claro que as empresas precisam ser cobradas, pressionadas e criticadas por falhas nos seus algoritmos, por “dark patterns” (termo usado para se referir a padrões que induzem o usuário a fazer algo que naturalmente não faria) e pelo abuso comercial dos dados coletados.

Um exemplo pessoal que ocorreu nas últimas semanas. A minha primeira tentativa de anúncio do meu curso no Instagram foi barrado pelo algoritmo, simplesmente porque apliquei uma transição no vídeo e, segundo ele, isso prejudicava a leitura da legenda (o que não aconteceu, já que a legenda estava por cima da transição). Pois bem.. na mesma semana um amigo me mostrou um anúncio que, aparentemente, seria do NuBank. Mas na realidade, era um golpe! Ou seja, usaram o nome da instituição para fazer um anúncio falso e roubar dados bancários, e o mesmo foi aprovado e estava sendo veiculado.

Mas fechando esse parênteses, o que eu realmente acho que é importante lembrarmos é da responsabilidade pessoal!

Acho complicado, apesar de tudo, atacar as redes como se elas fossem as únicas vilãs da história. Quem utiliza as redes também precisa assumir a responsabilidade por ter uma postura acrítica, antiética ou com motivações questionáveis (vaidade, egoísmo, autoafirmação e por aí vai…).

Para concluir, é importante entendermos que o uso “individual e particular” das redes tem desdobramentos públicos e coletivos. Ou seja, ainda que você se abstenha de usá-las, elas continuarão influenciando a economia ou a política, por exemplo. Continuarão sendo usadas para moldar gostos, preferências e opiniões, seja para o bem ou para o mal.

Na mesma rede em que se dissipam fake news, também há pessoas sérias fazendo algo relevante para o bem comum. Essa é a dualidade da coisa.

6 comments

  1. Katya Galheno

    Os prejuízos diante desse cenário são inúmeros quando nos deparamos com pesquisas comprovando que a mera presença de um smartphone no ambiente reduz a eficiência cognitiva. Não deixando de citar aqui, a Nomofobia, o medo irracional de estar sem celular ou aparelhos que possibilitam a conectividade do indivíduo a internet, também relacionada ao vício em tecnologias como videogames e computadores. Caracterizando assim, quanto maior a dependência digital, maior a fobia, pois a possibilidade de ficar incomunicável ou desconectado é algo a não ser suportado pelos “usuários”.
    Saber usufruir dos benefícios reais que estão à disposição dos consumidores das redes é essencial para o não adoecimento dos mesmos, possibilitando assim, uma maneira de valorizar uma cognição sustentável a partir do bom uso das tecnologias, que pode ser feito não apenas pelo hábito, mas como um estilo de vida saudável.

  2. Mira

    Uma excelente reflexão para nossos dias, “para tempos como esses”, em que perdeu -se o senso de responsabilidade e coletividade.

  3. Ivanete

    O atual governo do Brasil é questionável porquê?
    Foi eleito pelo voto Direto por 58 milhões de eleitores.

  4. Quésede Carvalho da Silva

    Esses dias percebi que simplesmente estamos escravos da tecnologia. Se eu estiver num determinado lugar e eu tiver algum “problema” com meu celular, simplesmente não conseguirei chamar um uber e não saberei ligar pra ninguém, porque não sei de cor telefone algum, a não ser o fixo do meu trabalho (Então isto não poderia acontecer num fim de semana, kkkkk). Isso me faz lembrar de uma série chamada Colony, em que algumas pessoas começaram a criar outros meios de se comunicar sem usar a tecnologia… doidera… E agora com a pandemia, estão nos empurrando mais ainda para o contato online… doidera… Jesus podia voltar logo e aí tudo ficaria bem! A boa notícia é que Ele está mesmo mais perto de voltar, porque os sinais que estão nas escrituras simplesmente estão se cumprindo, cada vez mais rápido!

  5. Roberto

    Ótimo texto. Conciso, preciso e inteligente.

    Parabéns.

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