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Resenha: Apologética para a glória de Deus

Escrita por Matheus Kevin da Silva Pelegrini, estudante do Programa de Tutoria – Turma Essencial 2021


FRAME, John. Apologética para a glória de Deus: uma introdução. Trad. Wadislau Gomes. São Paulo: Cultura Cristã, 2010.


Apologética para a glória de Deus é uma introdução à apologética cristã através de uma perspectiva reformada. Como introdução, John Frame aborda as bases e os principais tópicos da disciplina em questão. O livro possui nove capítulos que se dividem em quatro partes. Os capítulos um e dois abordam os fundamentos teóricos da apologética e do conteúdo de sua mensagem. Nos capítulos três, quatro e cinco o autor demonstra como utilizar a apologética para provar a existência de Deus e a veracidade do evangelho. Já nos capítulos seis e sete é tratado o problema do mal. Frame usa a apologética para defesa da fé cristã. Por fim, nos capítulos oito e nove a apologética é empregada de maneira ofensiva, expondo os problemas das cosmovisões concorrentes. Diferente da apologética clássica, todas as abordagens do livro partem de um sistema de pensamento que pressupõe a existência de Deus e a veracidade das Escrituras. Assim, o livro se enquadra na escola de apologética pressuposicional.

Frame inicia o primeiro capítulo com o texto bíblico chave da apologética, 1 Pedro 3.15-16, e com base nesse texto ele a define como a disciplina que ensina os cristãos a dar uma razão para sua esperança. Então, dentro dessa definição, a apologética atua em dar base racional para a fé cristã (como prova), responder às objeções dos descrentes (como defesa) e apontar a tolice do pensamento do descrente (ofensiva). Na sequência, o autor critica a apologética clássica em sua busca de um território neutro para debater com o descrente e lança a base da apologética pressuposicional afirmando que tanto a apologética quanto o apologeta devem se sujeitar ao senhorio de Cristo. Assim, deve-se assumir que as Escrituras são a verdade, pois Deus é o critério da verdade e não poderia haver algo acima dele. A seguir, Frame declara que como consequência desse pressuposto o cristianismo tem suas próprias categorias de pensamento, uma epistemologia cristã. O Autor também argumenta que não há problemas nisso, pois todas as tradições de pensamentos possuem também epistemologias próprias com pressupostos próprios também. Frame, então, conclui o capítulo fazendo uma comparação da apologética com a pregação, onde ambas possuem o mesmo propósito, mas com perspectivas e ênfases diferentes. Assim sendo, defender a Bíblia é apresentá-la como ela é, contextualizando-a e corrigindo interpretações distorcidas pelo pecado.

No segundo capítulo o autor aborda o conteúdo da apologética, que de maneira resumida seria apresentar a totalidade das Escrituras no contexto do interlocutor. Ele apresenta o cristianismo de duas formas, como filosofia e como boas novas. Como filosofia o cristianismo é uma forma compreensiva do mundo, uma cosmovisão, e concorre com outras filosofias e religiões. A seguir, Frame lança os fundamentos metafísicos, epistemológicos e éticos para uma filosofia cristã. Dos fundamentos metafísicos vale ressaltar Deus como personalidade absoluta, explicando a origem da pessoalidade nas coisas; Deus como transcendente e imanente, estando além da criação, mas presente nela; Deus como soberano, governando a história e a natureza; e por fim, Deus trino, sendo personalista, autossuficiente e autoexistente. Na epistemologia e ética, o autor afirma que Deus é a origem da verdade, assim como o padrão para o bem e o mal. Já como boa nova, Frame finaliza o capítulo afirmando que o cristianismo fornece solução para nossa natureza caída: a graça de Deus.

Logo após, no capítulo três, o autor inicia o uso da apologética como prova, e nesse capítulo é discorrido qual é a natureza dessa prova. Frame inicia afirmando que a fé não é mero pensamento racional, mas também não é irracional. Baseado no texto bíblico em 1 Coríntios 15.1-11, o autor argumenta que a confiança na Palavra de Deus deve ser evidência suficiente, entretanto há também uso de provas, como o apelo às testemunhas para provar a ressurreição de Cristo. Mas, nas Escrituras, a prova é direcionada para o insensato e não para o sábio, e a fé infantil é algo a ser copiada pelos adultos. O autor argumenta isso, pois segundo ele, há muitas coisas que a própria Bíblia não se preocupa em provar, como a existências de Deus, ela simplesmente parte desse pressuposto com bastante obviedade. Por isso, Frame propõe o argumento transcendental, criado pelo filósofo iluminista Immanuel Kant e adaptado para o cristianismo pelo filósofo cristão Cornelius Van Til, onde se parte de um pressuposto, e então constrói o mundo a partir dele. O autor admite a fraqueza desse argumento ao necessitar de outros argumentos tradicionais para sustentar as premissas, assim como reconhece também que não há um argumento que prove a existência de Deus de forma definitiva. Assim, o autor conclui alegando que a apologética deve se deter à área de dificuldade de cada pessoa, e buscar um ponto de contato, que é o conhecimento de Deus suprimido.

Nos capítulos quatro e cinco o autor apresenta os principais argumentos a favor da existência de Deus e da veracidade do evangelho. Sobre a existência de Deus, Frame faz uma breve descrição dos argumentos tradicionais: argumento moral, argumento epistemológico, argumento teleológico, argumento cosmológico e argumento ontológico. O autor dá uma ênfase maior para o argumento moral. Ele argumenta que é impossível negar a existência de valores morais, e que uma estrutura impessoal jamais conseguiria criar tais obrigações, pois elas surgem de relacionamentos pessoais. Desse modo, valores absolutos só poderiam vir de uma personalidade absoluta, como o autor elencou no capítulo anterior. Já para provar a veracidade do evangelho, Frame afirma que não há outro concorrente com as Escrituras que se enquadre com o Deus apresentado nos argumentos dos dois capítulos anteriores, então a Bíblia tem que ser a revelação divina. Segundo ele, a Bíblia é o testemunho de Deus acerca dele mesmo. E a razão para crermos nisso é a unidade que ela apresenta, mesmo sendo escrita por diversos autores de diversas épocas em diversos contextos, mostrando a soberania de Deus na condução da história. O autor finaliza o capítulo argumentando sobre a confiabilidade da divindade de Jesus, ao se proclamar Deus, fazer os mesmos atos que Deus fez e ser exaltado de forma singular nas Escrituras, algo que não aconteceu com nenhum outro homem.

Mudando para a abordagem defensiva, nos capítulos seis e sete é tratado pelo autor o problema do mal. Frame inicia descrevendo o problema pela perspectiva filosófica, que conclui que se o mal existe, não pode haver um Deus todo-poderoso e todo-bondoso. Mas ele vai além, traz o problema do mal para a vida comum, quando questionamos Deus pelas tragédias que ocorrem em nossas vidas. O autor já deixa claro logo no início que não há uma resposta para todas as questões desse assunto, e durante o restante do capítulo seis ele contra-argumenta diversas abordagens que tentam solucionar o problema do mal, mas que não se baseiam nas Escrituras. No capítulo sete Frame apresenta o que as Escrituras afirmam sobre o problema do mal. Ele inicia argumentando que as Escrituras não nos dizem que Deus nos deve explicações sobre suas ações, não temos o direito de nos queixar contra Deus e sua sabedoria não pode ser questionada. Mas ele alega também que isso não faz Deus injusto, pelo contrário, Ele é santo, justo e bom, e temos razões para confiar nele. Frame lança um olhar para o passado, presente e futuro para apresentar as razões para confiar em Deus, mesmo não tendo respostas para o problema do mal. No passado, Deus resolveu a tensão entre e a justiça e bondade por meio do sacrifício de Jesus de uma forma inesperada, então podemos confiar que ele fará isso novamente. Na abordagem do presente, o autor afirma que embora Deus busque o bem da criação, seu propósito não é a felicidade do homem e sim glorificar a si mesmo. Sendo assim, Deus usa do mal para atingir bens maiores, como demonstração de graça e justiça, confrontar valores, disciplina paterna dos crentes, julgamento do mal, entre outros. Por fim, no olhar para o futuro Frame ressalta a promessa de Deus, em que no futuro não haverá mais pecado e sofrimento. Quando chegar esse momento, o problema do mal não existirá mais.

Para concluir o livro, o autor faz uma breve abordagem da apologética ofensiva nos capítulos oito e nove. Ele inicia o capítulo classificando as cosmovisões não-cristãs como sabedoria convencional, e afirma que ela não faz jus aos valores de personalidade absoluta, e por isso não responde à confiabilidade da razão. No fim ela acaba levando ao ateísmo ou a idolatria, embora ambos se misturem. Como ateísmo, Frame distingue o teórico, que nega a Deus, do prático, que vive como se Deus não existisse. Já idolatria, ele define como prestar fidelidade última a algum ser além de Deus, se aplicando a deuses primitivos, princípios abstratos, religiões não cristãs, entre outros. O autor finaliza o capítulo oito argumentando como o ateísmo e a idolatria se dependem mutuamente, o primeiro para se rebelar contra Deus e a segunda para encontrar algo para colocar no lugar de Deus. No capítulo nove, Frame criou um diálogo fictício onde um cristão e um agnóstico discutem sobre a existência de Deus, e de maneira geral os principais argumentos do livro embasam a apologética do cristão, apresentando um exemplo de como a apologética deve ser realizada.

Como introdução, apologética para a glória de Deus é um livro que cumpre bem o objetivo de apresentar um panorama da apologética reformada. Os assuntos são bem divididos e distribuídos, todos eles são abordados de maneira equilibrada e honesta. O autor reconhece as fraquezas e os limites de cada argumento. É bastante fiel aos princípios que propõe em suas bases. Todo raciocínio exposto no livro parte das Escrituras ou então as utiliza como orientadora, respeitando o princípio da sola Scriptura. Entretanto, a leitura não é tão fácil, em muitos momentos é densa e enfadonha, não sei se isso se deve à tradução ou ao próprio livro. A linguagem não é tão acessível também, é necessária uma boa familiaridade do leitor com termos filosóficos e teológicos. Então, mesmo sendo uma introdução, não é recomendado para um leitor totalmente leigo. Concluindo, apologética para glória de Deus é como uma pedra bruta a ser minerada, necessita de um trabalho árduo, pode gerar calos nas mãos, mas no final o esforço é compensado.